Se observarmos duas fotografias da cidade de Mandalay, em Myanmar, uma tirada logo após o sismo de 28 de março e outra feita agora, mais de 100 dias após a catástrofe, é difícil encontrar as diferenças. As ruas continuam rasgadas por sulcos profundos, as casas e prédios desabados continuam a comprimir-se uns contra os outros, as pessoas ainda acampam em locais improvisados onde faltam as coisas mais elementares, como água.
De acordo com dados da Cáritas Internationalis, citados pelo Vatican News, até ao momento, 74% das comunidades não receberam ajuda humanitária, não apenas por falta de verbas, mas também devido à guerra civil entre grupos armados, que bloqueiam os poucos camiões de alimentos que conseguem ir chegando à região.
O padre José Estêvão Magro, nomeado esta segunda-feira, 7 de julho, diretor da organização humanitária New Humanity International (fundada pelo Pontifício Instituto das Missões Exteriores para ajudar todo o Sudeste Asiático), caminhou pelas ruas de Mandalay nos últimos dias e o que encontrou foi uma cidade praticamente em ruínas.
Em declarações à imprensa do Vaticano, o missionário brasileiro relatou que os restos de inúmeras estruturas destruídas pelo terramoto ainda estão espalhados pelo chão, muitas casas implodidas permanecem completamente abandonadas e algumas casas inabitáveis não foram protegidas ou demolidas.
“Milhares de famílias que perderam as suas casas continuam a ser acolhidas nas áreas de acolhimento que foram criadas nos arredores da cidade”, explica. Durante o dia, essas pessoas deixam os acampamentos em busca desesperada de comida, e apenas algumas têm forças e meios para tentar reconstruir as suas casas. “Não há nenhuma ação pública voltada para a reconstrução da cidade. Não há interesse da comunidade civil. O que se vê é apenas a vontade de consertar os prédios públicos destruídos na capital, Naypyidaw. Em Mandalay, a desolação é grande”, lamenta o padre José Estêvão Magro.
Julie Bishop, enviada da ONU ao país há pouco mais de um mês, disse na Assembleia Geral da ONU que “é alarmante” que a violência não tenha terminado depois do forte terramoto que matou mais de 3.000 pessoas e feriu milhares de outras. O cessar-fogo que chegou a ser anunciado por algumas das partes não foi respeitado, “criando uma crise dentro da crise”, e as pessoas em Myanmar passaram a ter de lidar com o conflito violento e com a devastação provocada pelo terramoto, afirmou Bishop.
Atualmente, ninguém sabe oficialmente quantos moradores existem nos acampamentos. O missionário já pediu várias vezes dados às autoridades, mas em vão: “Nem me souberam dizer quantos acampamentos foram montados depois do terramoto. Porque surgiram como cogumelos: no terreno de um mosteiro, no recinto de uma igreja, num local remoto. Há até pessoas que ocuparam prédios que, felizmente, permaneceram de pé: nos apartamentos onde vivia um núcleo familiar médio, vivem agora três ou quatro”, refere o religioso.
Além de comida, os deslocados precisam urgentemente de medicação. A Igreja local esforça-se por ajudar, “disponibilizando tudo o que vem do exterior”, mesmo tendo sido “profundamente ferida pelos tremores que destruíram paróquias, conventos e escolas católicas”.
Mas a comunidade internacional, essa, “esqueceu o sofrimento de Myanmar”, lamenta o responsável da New Humanity International. “Talvez a razão seja que tudo o que está a acontecer aqui diz respeito apenas ao povo birmanês e não tem repercussões externas. Mas aqui as pessoas continuam a morrer na mesma.”
Texto redigido por Clara Raimundo/jornal 7Margens, ao abrigo da parceria com a Fátima Missionária.








