Arménios étnicos de Nagorno-Karabakh transportam os seus pertences no telhado do carro, enquanto atravessam a fronteira com o Azerbaijão, perto de uma aldeia da Arménia | Foto: LUSA

Cem mil refugiados e a capitulação da resistência arménia do Nagorno–Karabakh é o resultado da ofensiva militar desencadeada no passado dia 19 de setembro pelas tropas do Azerbaijão, colocando fim aos mais recentes 35 anos de conflito naquela região do Cáucaso do Sul.

A solução encontrada para o problema está a passar por uma limpeza étnica da região, com uma população estimada em 145 mil pessoas, das quais 120 são de etnia arménia. Após a capitulação da resistência, a grande maioria da população de origem arménia abandonou todos os seus haveres, sob a ameaça de morte por parte das tropas do Azerbaijão. Desde dezembro de 2022, o Azerbaijão mantinha um bloqueio, impedindo Nagorno-Karabakh de se abastecer de bens essenciais.

Para alguns historiadores, a Arménia terá sido o primeiro reinado cristão do mundo, fundado no ano 301, tendo vivido séculos de dominação árabe e persa. As origens mais recentes do conflito surgem com a Revolução Russa, altura em que muçulmanos e cristãos arménios se envolveram num conflito pelo controlo da região. Com a criação da União Soviética, o território de Nagorno-Karabach foi integrado no Azerbaijão, embora tivesse um governo autónomo. Mas, com a crise e posterior dissolução do império soviético, o conflito reacendeu-se e, após seis anos de conflito e cerca de 30 mil mortos, as forças arménias obtiveram o controlo da região, autoproclamando um estado independente que, no entanto, nunca obteve um reconhecimento por parte das Nações Unidas.

Desde essa altura, os conflitos na região foram recorrentes. Em 2020, durante um novo conflito armado que durou 44 dias, o Azerbaijão recuperou cerca de um terço do território de Nagorno-Karabakh e, desde dezembro, passou a controlar uma ligação rodoviária de cerca de cinco quilómetros de extensão que ligava aquela região à vizinha Arménia.

Interesses cruzados
Isolados da Arménia e perante a passividade das forças de interposição de paz russas, a resistência capitulou rapidamente face a uma estratégia que, tudo indica, estava a ser delineada há bastante tempo pelo Azerbaijão, apoiada pela Turquia e armada por Israel. Apesar da independência nunca ter sido reconhecida internacionalmente, a resistência arménia capitulou após 24 horas de confrontos e renunciou a todas as suas pretensões sobre o território, que ficará oficialmente sob a administração das autoridades de Baku, a capital do Azerbaijão, a partir de 1 de janeiro de 2024.

Analistas políticos internacionais consideram que o desfecho do conflito representa um revés da Rússia. No entanto, Azerbaijão, Rússia e Irão também mantêm interesses comuns na região para a construção de um gasoduto de ligação à Turquia e de uma via-férrea comercial que poderá servir de alternativa ao atual transporte de mercadorias pelo canal de Suez. Em ambos os casos, os projetos implicarão passar pela região sul da Arménia. Até que ponto a população arménia de Nagorno-Karabakh foi parte destes acordos, será uma questão que só a história esclarecerá.

Carlos Camponez