O coordenador-geral dos Médicos Sem Fronteiras (MSF) no Burkina Faso, Hassan Maïyaki, traça um retrato da atual pandemia de Covid-19 naquele país africano. De acordo com o responsável, atualmente “nove das 13 treze regiões do país estão afetadas pela pandemia”. Dados do centro de operações de resposta a emergências sanitárias (CORUS) mostram que o Burkina Faso teve, em meados de abril, “mais de 500 casos confirmados, dos quais quase 30 pacientes morreram”.

Segundo Hassan Maïyaki, a situação “ainda está sob controlo”, mas a doença é agora “uma prioridade” para que se possa “evitar o pior”. Por isso, são várias as medidas que a organização humanitária está a tomar no país, em consonância com as autoridades de saúde locais. O responsável afirma que a atual pandemia pode ter “um impacto enorme” sobre a situação humanitária no país, uma vez que “amplifica os problemas existentes”.

“Dentro do país, existem mais de 800 mil pessoas deslocadas e o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) estima que mais de 2 milhões de pessoas precisarão de assistência humanitária este ano. A maioria dessas pessoas vive numa situação difícil: água potável insuficiente, acesso limitado a cuidados de saúde e muitas outras necessidades básicas não atendidas. O sistema de ajuda implantado pelos atores humanitários estava até agora subdimensionado e, há algumas semanas, a urgência era aumentar a ajuda e encontrar estratégias para chegar a áreas remotas para ajudar o maior número possível de pessoas. Hoje, quase toda a atenção está na gestão da Covid-19 e no controlo da propagação do vírus. Isso tem um grande impacto na resposta à crise humanitária”, lamenta o responsável, citado pelos serviços de comunicação dos MSF.

De acordo com o profissional, nas próximas semanas será necessário “encontrar um equilíbrio entre as respostas à Covid-19 e a crise humanitária, ou mesmo integrá-las, para que outras doenças como a malária, sarampo, meningite ou cólera não se espalhem e causem um grande número de vítimas, se não mais do que a Covid-19”.

Hassan Maïyaki lamenta também o facto de atualmente a “insegurança em algumas regiões” ser “tanta que por vezes” não é possível “levar ajuda onde ela é necessária”. Além disso, o responsável refere que “a pandemia pode reduzir ainda mais os meios de ação das organizações humanitárias”.

Para aumentar a oferta de ajuda humanitária, “as organizações precisarão de pessoal experiente”, afirma Hassan Maïyaki, acrescentando que a “mobilização de profissionais internacionais no Burkina Faso é limitada”. O responsável adianta que poderão existir “dificuldades em termos de fornecimento de medicamentos, devido a restrições internacionais”, assim como a impossibilidade de conseguir “equipamentos de proteção para o pessoal de saúde, na linha de frente da resposta à Covid-19”.

Hassan Maïyaki refere que “sem os recursos humanos, materiais e técnicos necessários para a ajuda humanitária, será mais desafiador oferecer assistência de boa qualidade aos pacientes quando os picos sazonais de desnutrição infantil e malária começarem”. De acordo com o profissional, estas “são emergências anuais na região do Sahel”, que se estão a aproximar e que “provavelmente causarão estragos a partir de junho em diante”.

O coordenador-geral dos MSF no Burkina Faso afirma que o país precisa de se “adaptar rapidamente a este novo contexto”, sem que tal tenha “consequências para as populações”. O responsável lembra que o país já é “muito afetado” pela existência de “quase um milhão de deslocados”, e de uma “pressão crescente sobre as comunidades locais que os recebem nas suas cidades”. “As consequências indiretas da pandemia de Covid-19 podem levar a uma nova fase de emergência, se as necessidades básicas não forem atendidas”, alerta o profissional.

De acordo com Hassan Maïyaki, outro dos desafios atuais é “evitar pânico ou desconfiança”, pelo que “é imperativo trabalhar com as comunidades, para evitar informações falsas, rumores e medo do vírus”. “Hoje é muito importante que consigamos deixar as emoções de fora dos debates em torno da pandemia e da resposta e que mantenhamos a calma”, conclui.