O Curso de Missiologia está a decorrer nas instalações dos Missionários da Consolata, em Fátima, até ao próximo sábado, dia 26 de agosto, com o propósito de qualificar o missionário e a missão. A formação conta com a participação de dezenas de pessoas, com percursos de vida muito distintos. Entre os formandos está Miguel Duque, de 26 anos. O jovem é natural de Abrantes, frequentou o Instituto dos Pupilos do Exército, em Lisboa, entre o oitavo e o 12.º ano, tirou uma licenciatura em Psicologia, no Reino Unido, e atualmente é aluno de um mestrado em Inovação Social na Universidade de Cambridge, em Inglaterra.

À boleia de uma comunidade cigana

À margem do seu percurso formativo, Miguel tem procurado viver experiências distintas. Não pelo dinheiro mas motivado por toda a envolvência, o jovem enveredou por uma experiência de trabalho temporário na vizinha Espanha. Aí contactou com uma realidade que mantém bem presente na memória. “A partir de Abrantes, apanhei boleia, e fui de carrinha, com uma comunidade de ciganos, para Logronho, no norte de Espanha, onde estive cinco semanas. Eles iam para a vindima, e eu juntei-me a eles”, começa por contar. “Havia imensa gente do norte de África a trabalhar lá. Havia escravização real. Os documentos eram apreendidos e as pessoas ficavam a viver em más condições. Eu fiquei num armazém onde as camas eram feitas com canas coladas com silicone, com tábuas de madeira que faziam de estrado, e depois tinham um colchão de espuma”, recorda.

“Vi ainda imensa gente do norte de África, e até da África Subsaariana. Gente de diversos países que vivem em Marrocos, e que depois, em ocasiões sazonais, vão para Espanha, uns de forma ilegal, outros por meios legais, mas que depois, devido à sua condição, são explorados. Ficam ali presos. É uma realidade de quase escravatura. Naquela altura da vindima era frio, e naquela localidade espanhola havia uma praça central, completamente cheia de cartões e dejetos, com pessoas ali a viver. Era ali o local de dormida daquelas pessoas”, lamenta o jovem.

Rumo ao Uganda

No final de 2017 Miguel contactou também com uma realidade bastante distinta, em Kampala, no Uganda, onde viveu “em casa de pessoas locais”. Partiu com o propósito de dar o melhor de si, mas a viagem apresentou imprevistos. “Fui para ficar três meses, mas fui roubado, e fiquei 12 dias”, refere. Fazer voluntariado após este episódio revelou-se um desafio. Após o roubo, procurou fazer o melhor que conseguia em prol da comunidade que encontrou. Foi “uma experiência intensa”, salienta.

“A missão de voluntariado no Uganda centrava-se na crise de milhares de crianças deslocadas e sem-abrigo da capital Kampala, famosamente associada a consumos, doenças e HIV/sida, crime, violência extrema e abusos, incluindo tráfico humano. Após o infortúnio da fraude que recaiu sobre mim e outros dois voluntários, fui o primeiro a conseguir sair da organização, tendo esperado os dois dias seguintes no aeroporto pelo próximo voo. Foi durante estes mesmos dois dias, que os outros voluntários contraíram o vírus da malária”, recorda.

“No contexto de missão, isto recorda-me frequentemente que o nosso sucesso não é o mesmo sucesso da missão intencionada. Pois a missão é de Deus. O nosso sucesso estará em discerni-la, e em render-se-lhe, ao invés de teimar com expetativas e objetivos autopropostos”, considera. A reflexão do jovem sobre a missão continua por estes dias, através do Curso de Missiologia, uma iniciativa da qual teve conhecimento através dos meios de comunicação social, e que agora se apresenta como mais uma oportunidade para enriquecer o percurso que tem vindo a trilhar ao longo dos últimos anos.

Texto: Juliana Batista