Ilustração: David Oliveira | Texto: Teresa Carvalho

Rita chegou um pouco mais cedo, e sentou-se à mesa do restaurante por ela escolhido. Adiantou-se a escolher o seu prato e o prato de Filipe. Para Filipe, ficava a tarefa de pagar o almoço de ambos: era essa a condição para poder descobrir a história da Sementinha Vermelha que Filipe prometera contar.

Esta história já fora contada por Filipe a um vasto número de pessoas, sempre nas mesmas condições impostas a Rita – e ninguém se reconhecia com capacidade para ser contador daquela história.

Filipe chegou pontualmente, devagar, apoiado em duas canadianas. Tinha uma doença que avançava lentamente, desde a sua juventude, e que já não o deixava correr, nem subir um degrau sem apoio, nem andar sem sentir as dores de todos os dias.

Nada disto para Filipe era impedimento de reinventar uma felicidade sempre nova, e nela, não deixava nenhuma limitação entrar.

Rita espreitou curiosa, tentando adivinhar onde Filipe escondia a célebre sementinha vermelha. Mas, nem uma caixinha, nem um embrulhito de papel, nem um saquinho, nada!

Filipe percebeu a curiosidade, e começou por enquadrar:
– Sabes, Rita, uma sementinha é capaz de gerar uma floresta! Uma floresta é capaz de se oferecer como casa de infinitos seres. Os seres que a floresta protege, alimentam-na, enriquecem-na e alargam as suas fronteiras e os seus horizontes.

De todas as sementinhas, as sementinhas vermelhas são as mais especiais: estão escondidas na maior parte do tempo e só exploradores persistentes a conseguem descobrir. Eu tive a sorte de a encontrar, mas só depois de muito tempo à procura.
– Estou curiosa, Filipe. Antes de mais, diz-me, trouxeste-a?
– Claro! Seria muito triste não a podermos ver, juntos!
– Mostra!
– Pois, terás de esperar…

A conversa sobre a floresta, as sementinhas, os seres da florestas, deu rapidamente lugar aos seres que povoaram as histórias reais de Filipe e de Rita, os percursos que foram galgados, e as aventuras que fizeram e as que ficaram suspensas,… revisitando lugares, gentes, tempos, e entendendo em conjunto um imenso povoar de vida que estava aconchegadinho e bem guardado nas batidas ritmadas do coração de cada um.

O tempo foi-se estendendo na mesa daquele almoço, e com ele, a descoberta da pessoa que cada um é foi-se desenrolando, devagarinho, com aquele respeito deslumbrado de quem olha para um tesouro precioso, tornado numa sementinha bem vermelhinha, alimentada pelos sentimentos que ficam germinando e regando a vitalidade das batidas do coração.
E os Amigos ficaram ainda mais amigos!

Rita não precisou falar novamente na sementinha vermelha.
Ela não só a viu, como a sentiu e levou com ela, pronta para a disseminar, com outros, numa mesa de restaurante, ou num outro lugar qualquer, onde ela, com alguém, se quisessem realmente encontrar, e fazer a sementeira dos sentimentos que congregam e se deixam encantar, fazendo da viagem em conjunto, uma descoberta fascinante!
Filipe pagou o almoço e saíram do restaurante.
Filipe continuou na sua epopeia de semear sementinhas vermelhas.
Rita, decidiu tornar-se, também ela, semeadora!