Ilustração: David Oliveira | Texto: Teresa Carvalho

Miriam viera de longe, do outro lado do mar, de um outro continente. Não viera na aventura: viera na esperança! Uma esperança partilhada por toda a família que ficara lá longe, rezando. Rezavam para que Miriam chegasse salva ao outro lado do mar. Pediam que tivesse a amiga a recebê-la, que não se perdesse, que encontrasse onde morar e com quem trabalhar. Rezavam para que Miriam pudesse, um dia, voltar para casa.

Miriam também rezava. As suas orações voavam até junto de quem deixara. Sempre que rezava, chorava de saudade e de dor. Pedia que não tivessem fome, que não chegasse a doença, que as tempestades fossem brandas e a seca não fosse prolongada, que a guerra não os atingisse.
Também rezava por si. Pedia trabalho, força e saúde para cuidar da sua família, lá longe. Pedia sabedoria para aprender a cuidar sabiamente de quem nela confiasse. Sabia que vinha para servir. E por causa desse serviço, os irmãos poderiam ir à escola, e, quem sabe, prosseguiriam nos seus sonhos. Os avós teriam remédios, e os pais, a ajuda para sustentar a família.

Não foi difícil conseguir trabalho. O seu jeito amável, a ternura dos gestos agradecidos, a prontidão de resposta à chamada, o desejo de aprender e de agradar e, sobretudo, o imenso respeito pelas pessoas ao seu cuidado, impressionaram quem passou a beneficiar da sua presença.

Quanto mais conhecia da vida deste novo lugar, mais Miriam se espantava com tantas coisas que as pessoas acumulavam, sem delas necessitarem, em contraste com a pequenez da felicidade que sentiam. Para quê tanto? Como não estar agradecidos? Como não ter vontade de cantar, de sorrir, de rir?! E porque não compartilhar?

No seu modo gentil e simples de ser, Miriam ia provocando um novo modo de estar.
Os queixumes que ouvia deram lugar a risos, o desânimo desinteressado deu lugar a espantos e partilha de culturas. A música e a dança com que Miriam animava as tardes dos idosos de quem cuidava, enchiam de ar renovado aquele espaço, agora de janelas escancaradas ao sol, com novo fôlego de vida e de sonho!

Miriam não tinha apenas trabalho. Tinha pessoas confiadas à sua responsabilidade, a quem quis conhecer e enaltecer nas suas canções, na dança, nas suas histórias traduzidas em contos. Esta é a sua cultura, esta é a sua lição.

Miriam não se queixa, não se diz cansada, não pede, não reclama falta de tempo, nem de nada.
Na verdade, todos os dias, ao se deitar e ao levantar, ela viaja até a sua casa, lá longe, e beija-os a todos, sabendo que o bater do seu coração é sentido lá em casa, e sente-se também abraçada e reforçada no seu modo de os amar, de cá, tão longe!.

Miriam abriu caminhos! Ensinou ao sol o caminho da sua casa, lá longe, e não se esqueceu de ensinar também o caminho das casas, aqui tão perto, aonde criou laços de cuidar.
Agora, por causa de Miriam, quando o sol nasce, ilumina e aquece a todos, lá longe, e cá perto! Ambos, Miriam e o sol garantem e ensinam que “lá tão longe” e “cá tão perto”, estão tão próximo, que podem dar as mãos!
Miriam sorri, feliz!