Na Faixa de Gaza, “enquanto as crianças sofrem, as armas continuam a matar e a ajuda não atravessa a fronteira. Enquanto crianças morrem, ao mesmo tempo, a solução para deter a violência não pode ser encontrada.” As palavras são do Vigário da Custódia da Terra Santa, padre Ibrahim Faltas, e foram divulgadas pouco depois de o chefe humanitário da ONU, Tom Fletcher, ter dito à BBC na manhã de terça-feira, 20 de maio, que 14 mil bebés poderiam morrer em Gaza no espaço de 48 horas se a ajuda humanitária não chegasse.
“A vida na Terra Santa está suspensa entre promessas de soluções de paz e certezas de morte. A morte e o sofrimento não são causados por eventos e catástrofes imprevisíveis, mas por mãos e mentes humanas inescrupulosas”, denuncia o padre Ibrahim Faltas na sua missiva, publicada pelos média do Vaticano.
E a situação das crianças é, para o clérigo, particularmente chocante: “Em Gaza, 950 crianças morreram no último mês e 20 mil desde o início da guerra; estima-se que cerca de um milhão de menores não tenham comida, cuidados ou educação”.
O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, já havia afirmado esta segunda-feira que dois milhões de pessoas estavam a morrer à fome na Faixa de Gaza enquanto “toneladas de comida permaneciam bloqueadas na fronteira” por Israel. Depois disso, cinco camiões de ajuda humanitária entraram finalmente na região, mas Fletcher logo denunciou que isso foi apenas uma “gota no oceano”, totalmente insuficiente para as necessidades da população, após 11 semanas de bloqueio. Já esta terça-feira, a ONU foi autorizada por Israel a levar “cerca de 100” camiões de ajuda humanitária para o território palestiniano de Gaza, anunciou o porta-voz do Gabinete de Assuntos Humanitários da organização, Jens Laerke
Ainda na segunda-feira, 22 países – incluindo Portugal – assinaram uma declaração conjunta, afirmando que a ONU e as organizações humanitárias “não podem apoiar” o novo modelo de entrega de ajuda ao território palestiniano decidido pelo Governo israelita. O povo da Faixa de Gaza “está a enfrentar fome” e “precisa de receber a assistência de que necessita desesperadamente”, pediram os 22 países, numa lista que se estende à Dinamarca, Estónia, Finlândia, Islândia, Irlanda, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Países Baixos, Nova Zelândia, Noruega, Eslovénia, Espanha e Suécia. A UE é também signatária, através da alta-representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Kaja Kallas.
O pronunciamento dos 22 países surgiu no mesmo dia em que França, Reino Unido e Canadá avisaram que não vão ficar “de braços cruzados” perante as “ações escandalosas” de Israel na Faixa de Gaza, ameaçando com “medidas concretas” se não parar a ofensiva militar.
Também a CAFOD – agência católica de origem britânica que integra a Cáritas e presta ajuda a populações necessitadas em mais de 40 países em todo o mundo – reagiu à insuficiente ajuda humanitária permitida por Israel à população na Faixa de Gaza.
“A exigência da CAFOD permanece inalterada desde o início desta crise: um cessar-fogo imediato, ajuda irrestrita em grande escala e a interrupção das vendas de armas do Reino Unido para Israel”, afirmou Elizabeth Funnell, representante da agência para o Médio Oriente. “Bombardear e matar de fome uma população e restringir o seu acesso à ajuda é uma violação do direito internacional”, acrescentou, esclarecendo: É fome de verdade — eles tentam chamar-lhe outros nomes para soar melhor, mas não, todos em Gaza passam fome no final do dia”.
Por seu lado, os eurodeputados irão debater na tarde desta quarta-feira, em Bruxelas, “a resposta da União Europeia ao plano de Israel de tomar Gaza e como enfrentar a atual crise humanitária e garantir a libertação dos reféns”.
“Não percamos tempo”, pede o padre Ibrahim Faltas no seu apelo. “Não percamos tempo para não perder a possibilidade de salvar vidas e a possibilidade de dar esperança a vidas. O tempo é precioso; quem não impede a violência, desperdiça-o sem amar.”
Texto redigido por Clara Raimundo/jornal 7Margens, ao abrigo da parceria com a Fátima Missionária.