Colum McCann, escritor, e Maria Ressa, prémio Nobel da Paz | Foto: Ricardo Perna/Diocese de Setúbal

Cerca de nove mil profissionais da comunicação de 138 países estão reunidos no Vaticano para participar no Jubileu do Mundo das Comunicações. O encontro teve início sexta-feira, 24 de janeiro, e estende-se até este domingo, dia 26, com a presença de mais de 40 comunicadores portugueses. Neste sábado, dia 25, decorreu uma Peregrinação à Porta Santa da Basílica da São Pedro, um encontro com o Papa Francisco, e um momento musical, conduzido pelo maestro Uto Ughi, um violinista italiano. Foi possível escutar o testemunho de uma jornalista e de um escritor, sob a moderação do jornalista italiano Mario Calabresi. Este encontro foi inaugurado por Paolo Ruffini, prefeito do Dicastério para a Comunicação, da Santa Sé, que apelou à “comunicação entre pessoas e não entre máquinas”. Num mundo em guerra, onde a desinformação é uma realidade, é essencial “partilhar histórias”, referiu.

Uma das oradoras foi Maria Ressa, uma jornalista filipino-americana de 61 anos, que em 2012 ajudou a fundar o ‘Rappler’, um website jornalístico promotor da liberdade de informação nas Filipinas, e que em 2018 integrou a lista ‘Personalidade do ano’ da revista ‘Time’ como membro de um grupo de jornalistas de todo o mundo que combatem notícias falsas. Em 2019, foi presa devido ao seu trabalho jornalístico, e em 2021 recebeu o Prémio Nobel da Paz, juntamente com o jornalista russo Dmitry Muratov, uma vez que o comité do prémio considerou que ambos contribuíram para “salvaguardar a liberdade de expressão, que é uma pré-condição para a democracia e uma paz duradoura”.

No encontro com os jornalistas, Maria Ressa disse que a “tecnologia recompensa a mentira”, e pediu aos comunicadores para trabalharem em prol da defesa da verdade. “Sem factos, não se pode ter a verdade, e sem a verdade não se pode ter confiança”, apontou. A Nobel da Paz considera que redes sociais se tornaram numa “arma de engenharia comportamental em massa”, e afirmou que as guerras atuais se travam com “algoritmos, desinformação e a destruição sistematizada verdade”. A profissional concluiu a sua intervenção apelando aos jornalistas para que “colaborem”, falem com “clareza mortal”, defendam “os mais vulneráveis” e “reconheçam” o seu poder.  “A esperança não é passiva, é ativa, incansável e estratégica”, sublinhou.

Este momento contou também com a intervenção de Colum McCann, um escritor irlandês distinguido já com vários prémios internacionais, autor de best-sellers como ‘Let the World Turn’, editado pelo Dicastério para a Comunicação, e ‘Apeirogon’, um livro onde o autor apresenta um conjunto de ângulos e pontos de vista, que mostram a complexidade do conflito no Médio Oriente. Na sua intervenção, Colum McCann comoveu a audiência ao apresentar história de dois pais, um israelita e outro palestiniano, que perderam as suas filhas no conflito, como um exemplo de “peregrinos de esperança”, uma vez que foram capazes de se “entender”.

‘Diálogos com a cidade’

Ainda na tarde deste sábado, vários locais de Roma acolheram a iniciativa ‘Diálogos com a cidade’. Num dos encontros voltou a ser possível escutar Maria Ressa, Colum McCann, Mario Calabresi e Paolo Ruffini. À semelhança do que aconteceu esta manhã, o testemunho de Maria Ressa voltou a gerar grande empatia entre a audiência. Maria Ressa voltou a chamar a atenção para o poder que detêm aqueles que controlam as redes sociais, que podem levar os utilizadores a ter uma visão muito delimitada da sociedade.

As palavras de Maria Ressa levaram uma religiosa a mostrar-lhe que o terreno missionário em que está envolvida está repleto de histórias que devem ser contadas, mas que há um grande receio de as contar com medo de represálias. Maria Ressa demonstrou a sua compreensão em relação à situação, e procurou mostrar que as pessoas devem sempre sentir-se seguras para poderem comunicar, e que devem também procurar empoderar quem está à sua volta.

Início oficial do jubileu

O programa oficial do Jubileu do Mundo das Comunicações iniciou na Basílica de São João de Latrão, em Roma, ao final da tarde da última sexta-feira, 24 de janeiro, com uma liturgia penitencial seguida da Missa internacional em memória de São Francisco de Sales, padroeiro dos jornalistas, cuja data litúrgica se celebrou nesse dia. A celebração contou com uma relíquia do santo em exposição.

A presidir à Eucaristia esteve o cardeal Baldo Reina, vigário-geral da diocese de Roma, que durante a homilia afirmou que o Jubileu “é um tempo de misericórdia” para todas as pessoas. “É um tempo em que revemos a nossa vida, não tanto à luz dos pecados que cometemos, mas, sobretudo, com a força da misericórdia de Deus”, referiu.