Maria Soares tem 69 anos e mora na favela Sol Nascente, nas proximidades de Brasília. Bispos do país têm procurado alertar para os problemas enfrentados pela população, através de diversas ações | Foto: LUSA

A Campanha da Fraternidade é promovida anualmente pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) no período da quaresma. A sua primeira edição aconteceu em 1964. Este ano, a Igreja brasileira apelou pela terceira vez à necessidade de se fazer uma reflexão sobre a fome, um assunto tão premente e assustador. A campanha teve como lema uma ordem de Jesus aos seus discípulos – “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt. 14:16). Para a CNBB, “é vocação, graça e missão responder ao chamamento de Deus e cumprir a ordem de Jesus”, que mostra que a fome é “um instinto natural de sobrevivência presente em todos os seres vivos”, sendo ela “uma tragédia, um escândalo”, e a “negação da própria existência”.

Dada a importância deste tema na sociedade brasileira, que afeta cada vez mais milhões de pessoas, a Câmara dos Representantes realizou, no passado mês de março, uma sessão plenária sobre a Campanha da Fraternidade de 2023, referindo querer “prestar homenagem à iniciativa da CNBB, que conduz a uma reflexão e ao empenho comunitário por ações de solidariedade que possam combater o flagelo da fome, que aflige uma parte considerável da população brasileira”. Esta era, de facto, a razão pela qual aquela sessão tinha sido pedida.

De acordo com a agência Fides, a sessão teve início com o hino nacional e com a apresentação do vídeo do Papa Francisco sobre a Campanha da Fraternidade de 2023. Seguiu-se a mensagem do presidente da Câmara dos Deputados, que acolheu o pedido da sessão: “Nesta casa onde a representação do povo brasileiro se manifesta de forma direta e legítima, não podemos ficar alheios às reflexões e debates diante de situações extremas. Não temos o direito de permanecer inativos até que os brasileiros tenham a certeza de que poderão preparar a próxima refeição. Temos que agir, e agir apressadamente, porque a fome tem pressa”.
A honorável deputada Juliana Cardoso, que pediu esta sessão com o deputado José Guimarães, recordou na sua intervenção que a quaresma no Brasil é marcada pelas Campanhas da Fraternidade, com temas que promovem o diálogo com a sociedade. Como tal, citou as campanhas precedentes, cujos temas trataram o ambiente, a cultura da violência e a população indígena, entre outros.

Joel Portela Amado, bispo auxiliar do Rio de Janeiro e secretário-geral da CNBB, agradeceu, na saudação aos deputados, a iniciativa dedicada a fomentar a reflexão e, sobretudo, a ação sobre o tema da fome no país. “Não creio estar a exagerar quando digo que este agradecimento provém de todas as pessoas que vivem a triste e vergonhosa situação de grave insegurança alimentar neste país”, disse o bispo. Depois de percorrer a história do nascimento das Campanhas de Fraternidade e dos seus objetivos, o bispo sublinhou que esta iniciativa existe apenas no Brasil, mesmo que noutros países hajam iniciativas semelhantes na quaresma.

Segundo o prelado, esta peculiaridade acrescenta uma grande responsabilidade na escolha do tema e na missão de o fazer chegar a toda a sociedade. A iniciativa é da Igreja Católica, mas quer chegar a toda a sociedade brasileira. O prelado evidenciou o problema da fome com a seguinte reflexão: “Como não pensar na fome por que passam milhões de irmãos nossos? A fome de uma pessoa deve atormentar-nos! É necessário agir para vencer a fome, para que o nosso país não veja a democracia ameaçada pela situação de insegurança alimentar, vivida de forma absurda por tantos. Se acreditamos na democracia, devemos unir-nos para a proteger cada vez que é ameaçada: e a fome é uma ameaça para a democracia”.

Texto: Álvaro Pacheco