a fome atinge níveis sem precedente no continente africano. O presidente da Nigéria, Olusegun Obasanjo, reflecte sobre a fome no continente e no seu país.
a fome atinge níveis sem precedente no continente africano. O presidente da Nigéria, Olusegun Obasanjo, reflecte sobre a fome no continente e no seu país. Há uma dor que não desaparece na barriga da África. Está a roer os nossos objectivos de desenvolvimento e as nossas economias. Está a ferir a vida dos mais novos e a encurtar a vida dos mais velhos; no entanto continua a ser esquecida. Que é esta praga? Um ví­rus sem cura? Um insecto que pica a nossa pele e envenena o nosso sangue? Se fosse tão dramático e cativante, talvez tivesse mais atenção. De facto, é muito mais prosaico. a fome é a praga da África. Está a avançar, sem sinais de retrocesso, e a consumir vidas hoje mais que nunca.
Uma pessoa com fome, é uma pessoa perigosa. é do nosso interesse eliminar a origem deste perigo. Há um ditado no meu país: quando se tira a fome da pobreza, a pobreza fica reduzida a metade. Essa é a razão pela qual damos máxima prioridade à eliminação deste obstáculo ao desenvolvimento.
Neste ano em que tanta energia tem sido empenhada na campanha “Faça da Pobreza História” e a Comissão para a África, temos que lembrar-nos que a fome e a desnutrição continuam a matar mais pessoas que a Sida, malária e tuberculose juntas. a comida é uma condição para a vida. Sem ela, a liberdade de comércio, o perdão da dívida e o alí­vio da pobreza têm pouco significado para milhões de agricultores africanos que cavam a terra e pastoreiam as suas cabras longe do olhar benevolente do mundo desenvolvido.
Não devemos esquecer que o primeiro dos objectivos para o desenvolvimento das Nações Unidas este milénio é um firme compromisso dos governos para “erradicar as condições inumanas de pobreza extrema e fome em que milhões de pessoas continuam a viver”.
a triste realidade que hoje enfrentamos é que enquanto a pobreza global diminuiu 20 porcento durante os anos 90, o número de pessoas com fome aumentou. Esforços para aliviar a pobreza têm tido mais sucesso com populações que têm algum acesso aos serviços sociais e à economia de mercado. Pelo contrário, as pessoas com fome em geral são parte de uma crescente subclasse que não tem acesso. Na última metade do século, quase mais cinco milhões de pessoas por ano sofrem fome. Hoje, o número total de pessoas em todo o mundo que sabem o que é ir para a cama com fome continua a ser de 852 milhões.
apesar do lento mas evidente progresso para fazer da pobreza história, a subclasse está a crescer e o mundo está a perder terreno na sua aposta para reduzir a metade a proporção dos que sofrem a fome até 2015. Num país como a Nigéria, políticas cuidadosamente planeadas promoveram a produção de comida, fortalecendo o sector agrí­cola, aumentando a exportação de comida e a entrada de dividendos, e criando emprego para centenas de pessoas.
Como presidente da Nova União para o Desenvolvimento da África, pedi a colaboração do Programa Mundial da alimentação (PMa) para fortalecer a agricultura e a investigação partilhando as melhores estratégias para aumentar a produção drasticamente. além disso, poupanças na dívida externa podem ser investidos directamente nestes sectores e assim beneficiar as pessoas. O PM a avaliou o custo da erradicação da fome para os 300 milhões de crianças da África e outros que vivem com os debilitantes sintomas da fome: cinco mil milhões de dólares, se orientados a melhorar a nutrição dos 100 milhões de crianças mais necessitadas. Poderia ter um impacto sí­smico.
O plano implica trabalho de equipa entre as nações ricas e pobres. aumentar a disponibilidade de comida e reduzir a fome é um objectivo para toda a África, por isso as nações em desenvolvimento seriam encorajadas a fazer a sua parte, contribuindo com dois mil milhões de dólares para as necessidades das mulheres e crianças, especialmente através dos programas de alimentação escolar. Por seu lado os países desenvolvidos contribuiriam com os restantes três mil milhões de dólares.
Quando penso na África actual lembro-me de Oliver Twist.como ele, a África está a lutar para sair da pobreza e do esquecimento com dignidade. é inaceitável que seja forçada a subir à mesa em Gleaneagles [lugar da reunião do G8] e dizer: “Por favor senhor, quero mais”. Não tem que ser assim. Em equipa temos a oportunidade de conquistar os nossos objectivos de desenvolvimento. Não podemos esquecer que a fome é a voraz criada da pobreza. Se não destruirmos uma, nunca atiraremos a outra para o caixote do lixo da história.

(Publicado em “Dawn”, jornal paquistanês em língua inglesa. Traduzido por Silvio Cabecinhas. )