Uma grande coligação de todos os partidos políticos do país propõe-se governar e sarar as feridas sociais que tanto sofrimento estão a causar
Uma grande coligação de todos os partidos políticos do país propõe-se governar e sarar as feridas sociais que tanto sofrimento estão a causarDepois de um referendo constitucional que, há dois anos, rejeitou a proposta de uma nova Constituição e depois das eleições políticas de 27 de Dezembro último, que dividiram o país em dois blocos antagónicos, o Quénia viu ontem, 18 de Março de 2008, aprovada por unanimidade na assembleia Nacional a lei que torna possível aquilo que até agora era impensável.
Foi emendada a Constituição para criar o cargo de primeiro ministro com poderes executivos e de dois vice primeiros ministros. Foi também aprovado uma partilha de poder em termos de igualdade entre os dois blocos políticos, o PNU (Partido de Unidade Nacional) do presidente Mwai Kibaki e o ODM (Movimento Democrático Laranja) de Raila Odinga.
Num gesto emblemático de reconciliação nacional o presidente Mwai Kibaki assinou ontem mesmo a lei que o parlamento acabara de aprovar. Foi um momento histórico. Embora pareça que a palavra histórico dificilmente se possa aplicar a uma lei feita e passada à pressa, o facto é que algo de extraordinário aconteceu. O Quénia, querendo Deus, pode ter aberto novos caminhos até mesmo para outros países africanos.
São os grandes remédios que se impõem quando grandes são os males. Vamos ver se o tão aclamado acordo abre caminho para a paz e harmonia sociais gravemente lesadas nestes tempos. O facto é que, embora os políticos se congratulem, a situação no terreno está longe de ser normal. Nas favelas de Nairobi as vizinhanças organizaram-se por grupos tribais numa espécie de ghettos urbanos que não prometem nada de bom. Nas zonas rurais os desalojados não só se sentem impossibilitados de voltar às suas casas, mas até mesmo estão a aumentar.
Tomo como exemplo a nossa missão da Consolata de Rumuruti numa zona de fronteira em que se misturam os Samburu, Turkana, Pokot, Kalenjin e Kikuyu e onde os ataques, especialmente contra os Kikuyus estão aumentando até ao ponto de nos últimos e poucos dias terem sido mortas umas vinte pessoas. O terreno da missão está agora ocupado por mais de quinhentas pessoas que residem e dormem na Igreja, no salão e em todos os espaços possíveis. Isto não é certamente progresso em direcção à reconciliação e à harmonia social.
Esperamos que as grandes injustiças históricas do último meio século sejam, quanto antes , finalmente resolvidas.