Ilustração: David Oliveira | Texto: Teresa Carvalho

Luís e Natália, naquele miradouro em formato de varanda, digna de um qualquer paraíso, tentavam registar com as câmaras, toda a sua beleza. Foi então que se aperceberam que não estavam sozinhos: um homem sentado num banco, cabisbaixo, segurando a cabeça entre as mãos, em silêncio, parecia tentar ser-lhes invisível.

A alguns metros, uma mota estacionada, em local de poder ser deixada ao abandono.
Luís e Natália olharam o senhor e o peso que ele parecia carregar. Olharam o precipício, a mota e souberam que aquele senhor não deveria estar ali. Não viera pela beleza. Viera por causa do seu desespero e do precipício. Precisava de ajuda especializada, já! Mas, para a aceitar, era necessário que quisesse a “esperança”.

Luís e Natália aproximaram-se e tentaram iniciar uma conversa, realçando que parecia necessitar de ajuda.
Ele não os olhou. Ocultou ainda mais a face num esforço de afastar intrusos, e assegurou sem qualquer convicção, numa voz sumida:
– Estou bem, só tenho uma dor de cabeça! – mas, o choro que tentava ocultar, balançava o seu corpo sem energia.

Os dois amigos decidiram que não sairiam dali sem levar aquele homem despedaçado pelo desespero.
Justificando que aquela “dor de cabeça”, sob aquele sol de verão, precisava de especialistas, teriam de levá-lo ao médico – ou pediriam a intervenção dos bombeiros.
– Bombeiros não! A minha mulher ia ficar aflita!

Acocorados à frente daquele senhor que não disse o nome, Luís e Natália deram-lhe todo o tempo que ele parecia precisar. E assim, permitiram-lhe desmontar uma história, descrita nas suas encruzilhadas e fracassos sem solução. Aos poucos, a confiança entre eles foi-se instalando, como se fosse algo que ele desejava há muito mas não acreditava poder acontecer.

Já de cabeça erguida, partilhando uma água e uns biscoitos que os dois amigos traziam, o senhor ouvia as alternativas para os problemas que ele não considerara. Rapidamente os telefonemas dos dois amigos sucederam-se, ficando ali agendadas entrevistas e ações concretas que poderiam desmontar os problemas que pareciam insolúveis.

Nesta confiança crescente, aquele senhor atreveu-se a dizer o nome:
– Eu sou Sérgio. Um dia, até há pouco tempo, eu era um grande homem!
E a história de desilusões contada há pouco, mostrou agora a outra versão: a recordação dos feitos de uma vida, relatados por um homem honesto e solidário.

À medida que falava da sua família, daquilo que os unia, da natureza do seu trabalho e dos valores que defendia, a vitalidade do senhor Sérgio regressava e aumentava a sua confiança naqueles desconhecidos que, não lhe pedindo nada, lhe exigiram o máximo – que abandonasse o seu plano de desistência e confiasse em si mesmo, nos que ele sabia que o amavam e naqueles que podem orientá-lo e apoiá-lo na procura de soluções.

Não era mesmo momento de desistir. Foi isso que o senhor Sérgio aprendera com estes dois amigos. Havia soluções e tinha agora um plano estabelecido. Sabia para onde ir, a quem recorrer, o que fazer.
Com os números de telefone partilhados e o próximo encontro marcado num café da cidade, os agora três amigos saíram daquele lugar, depois de testemunhar que a solidariedade existe de verdade e tem poder de ”dar vida” e “vida renovada”!