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A guerra na Ucrânia, o tempo adverso para a agricultura em resultado das mudanças climáticas, o aumento dos custos de energia, e os problemas de transporte surgidos desde o final da crise pandémica estão a causar um aumento generalizado dos preços, com efeitos particulares nos produtos alimentares que atingiram já níveis sem precedentes. Mas o aumento dos preços deste ano pode ser apenas o prenúncio de uma crise maior: a crise de falta de alimentos, que poderá ter lugar no próximo ano, alertou em junho o secretário-geral da ONU, António Guterres.

A guerra entre a Rússia e a Ucrânia envolve dois países que são responsáveis por cerca de 35 por cento dos cereais produzidos no mundo, para além de serem também produtores de fertilizantes para a agricultura. Este ano, o problema tem sido o de assegurar o escoamento da produção cerealífera acumulada nos silos ucranianos por causa do bloqueio dos portos do Mar Negro. Mas, para o ano, podemos estar a falar de ausência de produção, devido à continuação ou ao agravamento do conflito.

Em 2022, juntaram-se mais 47 milhões de pessoas ao número das que já necessitavam de ajuda humanitária, devido à falta de alimentos. Os problemas colocam-se de forma diferente, de acordo com as regiões e as circunstâncias. No Sahel, no norte de África, estima-se que o número de pessoas a necessitar de ajuda alimentar tenha aumentado dez vezes relativamente às necessidades verificadas em 2019, antes da crise da covid-19. Em países como o Egito, por exemplo, cerca de 80 por cento dos cereais são importados da Rússia e da Ucrânia. O Benim, o Chade, a Nigéria, a Etiópia, o Sudão do Sul, o Madagáscar ou o Iémen estão entre os países cujo agravamento da atual situação de crise alimentar está também a merecer particular preocupação pelas organizações de ajuda humanitária.

As próprias organizações humanitárias começam a sentir problemas para responder às necessidades de financiamento para garantir os alimentos nestas regiões. Os crescentes custos relacionados quer com os produtos alimentares, quer ainda com os transportes está a exigir montantes mais elevados para a ajuda humanitária.

Margem reduzida para responder à crise
Num recente destaque sobre a crise alimentar no mundo, a revista The Guardian Weekly referia que se os preços dos alimentos tinham sofrido um aumento de cerca de dez por cento na Grã-Bretanha, essa subida chegou aos 40 por cento no Quénia ou no Paquistão.

Países com rendimentos médios como a Argentina, o Brasil, o Egito, as Filipinas, a Tunísia ou o Paquistão, poderão enfrentar também grandes dificuldades caso a crise alimentar se prolongue por mais tempo. Como se não bastasse, nos últimos dois anos, muitos países tiveram de se endividar para enfrentarem os problemas suscitados pela pandemia da covid-19, pelo que a margem para responderem às ameaças da atual crise começam a ser muito reduzidas.

Texto: Carlos Camponez