Bento XVI refere-se à falta de sacerdotes em algumas regiões, assinala a vida consagrada como opção, pede orações pelas vocações e exorta todos os cristãos à vivência da sua vocação.
Bento XVI refere-se à falta de sacerdotes em algumas regiões, assinala a vida consagrada como opção, pede orações pelas vocações e exorta todos os cristãos à vivência da sua vocação. Venerados Irmãos no Episcopado
Queridos Irmãos e Irmãs!
a celebração do próximo Dia Mundial de Oração pelas Vocações oferece-me a ocasião para convidar todo o povo de Deus a reflectir sobre o tema da Vocação no mistério da Igreja. Escreve o apóstolo Paulo: “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo… Ele nos escolheu antes da constituição do mundo… predestinou-nos para sermos seus filhos adoptivos por meio de Jesus Cristo” (Ef 1, 3-5). antes da criação do mundo, antes da nossa vinda à existência, o Pai celeste escolheu-nos pessoalmente, para nos chamar a entrar em relação filial com Ele, mediante Jesus, Verbo encarnado, sob a guia do Espírito Santo. ao morrer por nós, Jesus introduziu-nos no mistério do amor do Pai, amor que o envolve totalmente e que Ele oferece a todos nós. Neste mundo, unidos a Jesus, que é a Cabeça, nós oferecemos um só corpo, a Igreja.
O peso de dois milénios de história torna difícil compreender a novidade do mistério fascinante da adopção divina, que está no centro do ensinamento de São Paulo. O Pai, recorda o apóstolo, deu-nos “a conhecer o mistério da sua vontade,… reunir sob a chefia de Cristo todas as coisas” (Ef 1, 9-10). E acrescenta: “Nós sabemos que Deus concorre para o bem dos que O amam, daqueles que, segundo o seu desí­gnio, são eleitos. Porque os que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de Seu Filho, a fim de que este fosse o Primogénito de muitos irmãos” (Rm 8, 28-29).
a perspectiva é verdadeiramente fascinante: somos chamados a viver como irmãos e irmãs de Jesus, a sentir-nos filhos e filhas do mesmo Pai. é um dom que inverte qualquer ideia e projecto exclusivamente humanos. a confissão da verdadeira fé abre as mentes e os corações ao mistério inexaurí­vel de Deus, que invade a existência humana. Então que dizer da tentação, muito forte nos nossos dias, de nos sentirmos auto-suficientes, chegando a fecharmo-nos ao plano misterioso de Deus em relação a nós? O amor do Pai, que se revela na pessoa de Cristo, interpela-nos.
Para responder à chamada de Deus e pôr-nos a caminho, não é necessário ser já perfeitos. Sabemos que a autoconsciência do nosso pecado permitiu que o filho pródigo empreendesse o caminho do regresso e que experimentasse assim a alegria da reconciliação com o Pai. a fragilidade e os limites humanos não representam um obstáculo, sob condição de que contribuam para nos tornar cada vez mais conscientes do facto que temos necessidade da graça redentora de Cristo. Esta é a experiência de São Paulo que dizia: “Portanto, prefiro gloriar-me das minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo” (2 Cor 12, 9).
No mistério da Igreja, Corpo mí­stico de Cristo, o poder divino do amor muda o coração do homem, tornando-o capaz de comunicar o amor de Deus aos irmãos. ao longo dos séculos muitos homens e mulheres, transformados pelo amor divino, consagraram as próprias existências à causa do Reino. Já nas margens do mar da Galileia, muitos se deixaram conquistar por Jesus: andavam em busca da cura do corpo ou do Espírito e foram tocados pelo poder da sua graça. Outros foram escolhidos pessoalmente por Ele e tornaram-se seus apóstolos. Também encontramos pessoas, como Maria Madalena e outras mulheres, que o seguiram por iniciativa própria, simplesmente por amor, mas, ao mesmo nível do discí­pulo João, também elas ocuparam um lugar especial no seu coração.
Estes homens e estas mulheres, que através de Cristo conheceram, o mistério do amor do Pai, representam a multiplicidade das vocações desde sempre presentes na Igreja. Modelo de quem é chamado a testemunhar de maneira particular o amor de Deus é Maria, a Mãe de Jesus, directamente associada, na sua peregrinação de fé, ao mistério da Encarnação e da Redenção.
Em Cristo, Cabeça da Igreja, que é o seu Corpo, todos os cristãos formam “a raça eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, a fim de anunciardes as virtudes d’aquele que vos chamou das trevas” (1 Pd 2, 9). a Igreja é santa, mesmo se os seus membros têm necessidade de serem purificados, para fazer com que a santidade, dom de Deus, possa resplandecer neles até ao seu pleno esplendor.
O Concílio Vaticano II ressalta a chamada universal à santidade, afirmando que “os seguidores de Cristo, chamados por Deus e justificados no Senhor Jesus, não por merecimento próprio mas pela vontade e graça de Deus, são feitos, pelo Baptismo da fé, verdadeiramente filhos e participantes da natureza divina e, por conseguinte, realmente santos” (Lumen gentium, 40).
No âmbito desta chamada universal, Cristo, Sumo Sacerdote, na sua solicitude pela Igreja chama depois, em cada geração, pessoas que se ocupem do seu povo; em particular, chama ao ministério sacerdotal homens que exercem uma função paterna, cuja nascente está na própria paternidade de Deus (cf. Ef 3, 15). a missão do sacerdote na Igreja é insubstituí­vel.
Por isso, mesmo se em algumas regiões se registra escassez de clero, nunca deve faltar a certeza de que Cristo continua a suscitar homens, os quais, como os apóstolos, tendo abandonado qualquer outra ocupação, se dedicam totalmente à celebração dos sagrados mistérios, à pregação do Evangelho e ao ministério pastoral.
Na Exortação apostólica Pastores dabo vobis, o meu venerado Predecessor João Paulo II escreveu em relação a isto: ” a relação do sacerdote com Jesus Cristo e, n’Ele, com a Sua Igreja, situa-se no próprio ser do presbí­tero, em virtude da sua consagração/unção sacramental, e no seu agir, isto é, na sua missão ou mistério. Em particular, o sacerdote ministro é servo de Cristo presente na Igreja mistério, comunhão e missão. Pelo facto de participar da “unção” e da “missão” de Cristo, ele pode prolongar na Igreja a sua oração, a sua palavra, o seu sacrifí­cio e a sua acção salví­fica. é, portanto, servidor da Igreja mistério porque actua os sinais eclesiais e sacramentais da presença de Cristo ressuscitado” (n. 16).
Outra vocação especial, que ocupa um lugar de honra na Igreja, é a chamada vida consagrada. a exemplo de Maria de Betânia, que “se sentara aos pés do Senhor e escutava a Sua palavra” (Lc 10, 39), muitos homens e mulheres consagraram-se a um seguimento total e exclusivo de Cristo. Eles, mesmo desempenhando diversos serviços no campo da formação humana e do cuidado dos pobres, no ensinamento ou na assistência dos doentes, não consideram estas actividades como a finalidade principal da sua vida, porque, como ressalta bem o Código de Direito Canónico, “o primeiro e principal dever de todos os religiosos deve ser a contemplação das verdades divinas e a união constante com Deus na oração” (cân. 663, 1).
E na Exortação apostólica Vita consecrata João Paulo II escreveu: “Na tradição da Igreja a profissão religiosa é considerada como um singular e fecundo aprofundamento da consagração baptismal, visto que nela a união í­ntima com Cristo, já inaugurada no Baptismo, evolui para o dom de uma conformação expressa e realizada mais perfeitamente, através da profissão dos conselhos evangélicos” (n. 30).
Recordando a recomendação de Jesus: ” a messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Rogai, portanto, ao Senhor da messe que envie trabalhadores para a sua messe” (Mt 9, 37), sentimos profundamente a necessidade de rezar pelas vocações ao sacerdócio e à vida consagrada. Não surpreende que, onde se reza com fervor, floresçam as vocações. a santidade da Igreja depende essencialmente da união com Cristo e da abertura ao mistério da graça que age no coração dos crentes. Por isso gostaria de convidar todos os fiéis a cultivar uma í­ntima relação com Cristo, Mestre e Pastor do seu povo, imitando Maria, que guardava no seu coração os mistérios divinos e meditava-os assiduamente (cf. Lc 2, 19). Juntamente com Ela, que ocupa um lugar central no mistério da Igreja, rezemos:
ó Pai, faz surgir entre os cristãos
numerosas e santas vocações
ao sacerdócio,
que mantenham viva a fé
e conservem a grata
memória do teu Filho Jesus
mediante a pregação da sua palavra
e a administração dos Sacramentos,
com os quais tu renovas
continuamente os teus fiéis.
Concede-nos ministros santos
do teu altar,
Que sejam atentos e fervorosos
guardas da Eucaristia,
Sacramento do dom supremo
de Cristo para a redenção do mundo.
Chama ministros da tua misericórdia,
que, mediante o sacramento
da Reconciliação difundam
a alegria do teu perdão.
Faz, ó Pai, com que a Igreja
acolha com alegria as numerosas
inspirações do Espírito do teu Filho
e, dócil aos seus ensinamentos,
se preocupe pelas vocações
para o ministério sacerdotal
e para a vida consagrada.
ampara os Bispos, os sacerdotes,
os diáconos, os consagrados
e todos os baptizados em Cristo,
para que cumpram fielmente
a sua missão ao serviço
do Evangelho.
Isto te pedimos
por Cristo nosso Senhor. amém.
Maria, Rainha dos apóstolos,
reza por nós!
Vaticano, 5 de Março de 2006.
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