Convidamos o leitor a “espreitar” as celebrações natalí­cias em países de três continentes, através do testemunho de três missionários
Convidamos o leitor a “espreitar” as celebrações natalí­cias em países de três continentes, através do testemunho de três missionáriosO Natal é uma das principais festas cristãs celebradas em todo o mundo. Se o nascimento de Jesus Cristo é o evento central que a todos nos une, o modo de o celebrar, dentro e fora da liturgia, é vivido com expressões típicas de cada cultura. Convidamos o leitor a “espreitar” as celebrações natalícias em países de três continentes, através do testemunho de três missionáriosMONGÓLIa: UM DI a DE TRaBaLHO a Mongólia dos nossos dias é um país em grande mudança. Nos 15 anos de presença como missionários da Consolata temos assistido a uma rápida transformação: desde as consequências de um regime comunista que durou 70 anos, com uma política de afastamento quase total do resto do mundo e a difusão do ateísmo estatal, à miragem de um desenvolvimento económico inserido na exploração dos enormes recursos minerais, gerido mais ou menos sabiamente pela nova classe dirigente. Nos anos 90, nem sequer se falava de Natal. até aos primeiros anos após o ano 2000 não havia sinais externos que remetessem para algo de especial e ainda agora o 25 de dezembro é um dia de trabalho como os outros. Hoje, porém, com a abertura à economia global, chegaram também os símbolos externos do Natal comercial, sem que as pessoas tenham entendido a razão: um belo presente que brilha, mas não se sabe porque é que é oferecido. Uma situação paradoxal, que conduz a novas formas de consumismo, prejudiciais para uma mentalidade tradicionalmente pouco habituada a uma gestão ponderada do dinheiro. Fundamentalmente, as celebrações do fim de ano civil têm preponderância sobre o evento religioso, tendo em conta que os cristãos na Mongólia são apenas dois por cento da população (e os católicos ainda menos). O verdadeiro fim de ano é o lunar, uma grande festa de sabor antigo que acontece entre o fim de janeiro e a metade de fevereiro, na qual estão sedimentadas tradições intemporais, ligadas ao ciclo da natureza: deixa-se para trás o pior do inverno para abraçar finalmente uma nova primavera. a pequena comunidade católica da Mongólia, pelo contrário, vive intensamente o grande mistério da encarnação. É a celebração sacramental daquele encontro que mudou as suas vidas, dando-lhes a possibilidade de uma relação pessoal com o Deus vivo, que liberta dos medos dos espíritos e garante uma verdadeira proximidade. O próprio contexto pastoril ajuda a entranhar-se nos acontecimentos de Belém: temos pastores de carne e osso que vigiam o rebanho e que não têm dificuldade em imaginar o espanto de um Deus nascido numa manjedoura. Vivêmo-lo também nós juntamente com eles. É uma grande dádiva para nós missionários reviver assim, juntamente com os amigos da Mongólia que abriram as portas a Cristo, a graça da salvação que vem ao nosso encontro; e é também um desafio para nós conseguir acompanhá-los e apoiá-los na fé num contexto muito particular, que com frequência não vê com bons olhos a sua opção cristã. aproveitamos sempre os dias da novena de Natal para um tempo de retiro e de reconciliação. a pequena comunidade de arvaiher reencontra então a paz do perdão recebido e oferecido e celebra com simplicidade e intensa participação o dom do Emanuel. O mundo lá fora pensa nas celebrações do fim do ano, mas para nós cristãos é a noite de Natal, na qual rezamos para que o Deus connosco traga tanta paz e fraternidade a um país que corre para a miragem da riqueza, com o risco de perder em humanidade e justiça. COST a DO MaRFIM: LUZ, ESPERaNÇ a E CORVivi 13 natais neste país em quatro missões diferentes, duas do norte e duas do sul, das quais três em contexto rural e uma em contexto urbano, duas em que a maioria era muçulmana e duas em que a maioria era cristã. No que toca ao contexto rural e muçulmano, o Natal não tem impacto social. É uma celebração religiosa centrada no acontecimento da encarnação. Está cheia de profundidade sagrada e humana, porque as pessoas dão graças a Deus pelo amor encarnado e, ao mesmo tempo, organizam-se para usar todos os mesmos trajes e comer juntos. O Natal é comunidade de comunidades. Num contexto urbano e cristão, o Natal nota-se bem nas ruas. as luzes, a decoração, tudo nos faz lembrar que é um tempo de alegria, paz e reconciliação. Também de consumo. as celebrações são melhor preparadas liturgicamente. a liturgia, os coros, os jovens brilham em todo o seu esplendor. a fragilidade e a precariedade são as palavras que acho mais ajustadas para descrever a situação em que vivem as maiorias. Vivemos numa situação de paz frágil que se pode romper a qualquer momento. as condições de trabalho são muito precárias. O desemprego dos jovens é muito alto. Muitos jovens que terminaram o segundo ciclo ou com licenciatura, não conseguem um emprego estável, o que torna muito difícil realizar um projeto de vida. Nesta realidade, o Natal aqui é luz, esperança, calor e cor. É uma sociedade mais unida na diversidade, onde 24 por cento da população é estrangeira. Uma realidade que caracteriza não apenas a realidade social e política, mas também a realidade eclesial. Por exemplo, na diocese de San Pedro, mais de 90 por cento dos cristãos são estrangeiros, a maioria deles de Burkina Faso. Essa realidade é também uma oportunidade para que a adoração dos Magos do Oriente se faça carne nessas culturas. POLÓNIa: NaTaL aTÉ FEVEREIRONa Polónia, um país de longa e antiga tradição cristã, o Natal celebra-se com particular afeto num clima que reúne todas as famílias. a vigília de Natal marca o início das festividades, com a preparação da árvore e adornos natalícios. Na noite da vigília, acontece a ceia solene para a qual se convida toda a família. O pai de família começa por ler o Evangelho do nascimento narrado por São Lucas. Em seguida benze-se o opuatek, um pão branco, semelhante à hóstia, com cenas natalícias gravadas. Cada pessoa fica com um na mão, que depois da bênção é partido e partilhado com todos os presentes. ao mesmo tempo, trocam-se os votos de bom Natal e podem também endereçar-se pedidos de perdão, caso exista algum tipo de litígio, porque é importante estar em paz com todos para bem celebrar e acolher na própria vida o nascimento de Jesus. após este rito, inicia-se a ceia solene da vigília que consta de 12 pratos, um número simbólico que recorda o número dos meses do ano e o número dos apóstolos. Para a ceia não há carne (a vigília é dia de abstinência); os pratos são à base de verduras e peixe, pescado nos rios ou lagos e no mar Báltico. Durante a comida dos 12 pratos, há intervalos preenchidos com cânticos natalícios (kolede), alguns até com séculos de história, cantados com melodias muito simples e por todos. Depois da troca dos presentes, no fim do serão, dirigem-se todos para a Missa da meia-noite, chamada a Missa dos Pastores (porque foram eles que viram a estrela que os guiou até à gruta de Belém). No dia seguinte, dia de Natal, chamado primeiro dia da festa, todos vão à Missa da manhã, e voltam para as suas casas, para o almoço solene, desta vez à base de carne, momento acompanhado com cânticos natalícios. Repete-se a mesma cena no dia de Santo Estêvão, chamado o segundo dia da festa. Convém recordar que na Polónia o tempo natalício começa no dia da festa de Natal e continua até ao dia 2 de fevereiro, de modo que durante todo o mês de janeiro se celebra o Natal, sobretudo cantando. Esta maneira tão rica e prolongada de celebrar o Natal transmite-nos esta simples mas profunda verdade: Deus está perto de nós, na nossa vida e na vida das pessoas que encontramos. É n”Ele que podemos encontrar a força para afrontar as dificuldades e recuperar a alegria que nos permite partilhar com os outros os bens que possuímos.