Os peregrinos que se deslocam a pé ao Santuário de Fátima fazem-no cada vez mais em grupos organizados e procuram fazer da caminhada uma experiência espiritual profunda, diz o reitor, padre Carlos Cabecinhas
Os peregrinos que se deslocam a pé ao Santuário de Fátima fazem-no cada vez mais em grupos organizados e procuram fazer da caminhada uma experiência espiritual profunda, diz o reitor, padre Carlos CabecinhasOs peregrinos de há 50 anos, aquando da visita do Papa Paulo VI, e os peregrinos de hoje são diferentes? Eu creio que o peregrino hoje, em alguns aspetos, nos seus anseios, não é diferente do peregrino de há 50 anos. Mas na forma como procura resposta para os seus anseios é diferente. É menos um peregrino de promessas? É menos o peregrino das promessas, sem dúvida. E é também um peregrino mais culto, com outras buscas? Eu diria que ao longo dos anos também a fisionomia do peregrino se foi transformando. a peregrinação deixou de ser comutada como um fenómeno secundário e meramente popular, no sentido mais negativo, isto é, da populaça. Hoje, o peregrinar é cada vez mais entendido como uma experiência profunda de fé. Mesmo o peregrinar a pé – e o peregrinar não se reduz a essa forma de vinda ao santuário – transformou-se radicalmente em relação àquilo que era há 50 anos. Hoje, vemos peregrinos a pé de todas as classes sociais, com todos os níveis de formação académica e com o mais variado leque de pertença eclesial e sentido de pertença eclesial. Eu diria que hoje se redescobre de novo a espiritualidade da peregrinação. E Fátima aí teve um lugar fundamental, ajudou a redescobrir esta dimensão espiritual da peregrinação como caminhada. Eu repito muitas vezes aquilo que me parece fundamental, a peregrinação não é apenas o ir a um lugar diferente, mas é fundamentalmente ir a um lugar diferente para voltar diferente, para voltar transformado. E penso que Fátima teve, no contexto português, pelo menos, este grande mérito de ajudar a redescobrir esta espiritualidade profunda da peregrinação, como ir a um lugar diferente para voltar diferente, porque transformado por Deus. Isto não poderá ser uma espécie de teologização ou espiritualização do peregrino, no sentido teórico? Será que os peregrinos de facto, aqueles que caminham até Fátima, já perceberam isto? Os guias que hoje acompanham muitos dos grupos perceberam esta missão? Eu não posso generalizar e dizer que todos perceberam. Posso dizer é que muitos, muitíssimos, têm esta perceção. E falo quer dos guias, quer daqueles que organizam as peregrinações que têm cada vez mais a preocupação de lhe dar um conteúdo espiritual. Portanto, nós temos trabalhado juntamente com o movimento da Mensagem de Fátima e não só, mas trabalhado com os guias de peregrinos a pé, com outros guias de peregrinos e vemos que vai crescendo a sensibilidade dos próprios guias e organizadores de peregrinações a Fátima e o sentido da necessidade de dar conteúdo espiritual à própria peregrinação. Não é uma excursão a Fátima é uma vinda como peregrinação. Para muitos é até uma oportunidade de perder uns quilos, um contributo para a dieta Sim, também. Hoje em dia nós não temos a menor dúvida que o fazer uma caminhada com efeito higiénico recolhe atrativo, ao contrário de quando nós dizemos que é por penitência, tem sempre uma carga muito, muito negativa. a verdade é que as pessoas vêm. Vêm não fundamentalmente com essa motivação, vêm porque querem fazer e porque procuram essa experiência profunda. Vêm cada vez mais em grupos organizados, ou quando não vêm em grupos organizados procuram de facto preparar-se para fazer da caminhada uma experiência espiritual profunda, e quando chegam ao Santuário vemos a forma como se comovem, a forma como ficam tocados. a peregrinação é um rezar com o corpo. Muitas vezes a nossa grande dificuldade é esta: o peregrino não teoriza, o peregrino experimenta. E o importante é dar ao peregrino a possibilidade de fazer essa forte experiência de fé. De rezar com o corpo. De sentir no esforço da caminhada, na solidariedade com aqueles com quem caminha, descobrir o rosto de Deus e descobrir o quanto Deus o atrai e o chama.