O convite à oração que, ao por do sol, os minaretes, dotados de poderosos altifalantes, espalham a todo o volume, anuncia o fim do jejum.
O convite à oração que, ao por do sol, os minaretes, dotados de poderosos altifalantes, espalham a todo o volume, anuncia o fim do jejum. De improviso e por cerca de meia hora cessa todo o bulício da cidade, reina o silêncio e a calma. Podem agora as famílias juntar-se à volta da mesa e em clima de festa consumir os alimentos que ao longo do dia as mães prepararam ou foram buscar a um mercado muito bem fornecido. E depois da refeição a gente gosta de sair à rua e ir à mesquita para a oração da noite. É assim em cada dia do Ramadão.
Mas no dia 3 de Novembro toda a gente contava que este era o último dia. a decidi-lo não era o sol-posto ou o convite do muezim; havia de ser a lua a confirmá-lo mais tarde quando olhos atentos a avistassem no céu. Foi assim que começou e assim havia de terminar o mês sagrado do Ramadão, dando lugar à festa de Id-el-Fitr (romper o jejum).
Um mês sagrado
O preceito do Ramadão – um dos cinco pilares do Islão – consiste em observar jejum rigoroso de comida e bebida do nascer ao por do sol todos os dias do mês sagrado. O muçulmano deve igualmente abster-se de relações sexuais, do tabaco e de outros prazeres no mesmo período. É um tempo de purificação do corpo e do espírito.
Desde as crianças da escola até às pessoas de idade, não se vê ninguém a faltar ao preceito.
Está provado que há uma grande pressão social de desaprovação e intolerância para com quemquer que ousasse transgredir. Há estados muçulmanos (basta citar a Jordânia aqui ao lado, um entre tantos) onde a mínima infracção em público, mesmo praticada por um estrangeiro ou cristão, atrai logo a polícia e acarreta punição.
Outros dois pilares do Islão estão muito em evidência neste mês: a obrigação da esmola dá azo a um aumento exponencial da mendicidade. Nos caminhos para a mesquita, por onde hão-de passar os fiéis que se dirigem à oração, postam-se os pedintes. São sobretudo mulheres, de todas as idades, com alguma criança ao colo ou ao lado, que estendem a mão aos passantes e lhes recitam incessantemente o apelo à esmola.
O outro pilar é a oração. Em Jerusalém ela marca o Ramadão de modo especial. Há mesquitas por todo o lado, mas a grande atracção é al-aqsa, uma das duas que ocupam a esplanada onde se erguia o antigo templo de Salomão, e que é, depois de Meca e Medina, o terceiro lugar mais sagrado do Islão. Todas as sextas feiras, mas sobretudo a primeira e a última do Ramadão, acorre gente de perto e de longe, às dezenas de milhares, e move-se para a oração do meio dia, aos apertões, como uma torrente a que as ruelas estreitas e atochadas de comércio da Cidade Velha dificilmente conseguem dar escoamento. ao sentido de peregrinação junta-se um certo espírito reivindicativo, que é o que mais cuidados dá às forças militares e policiais de Israel que desde manhã cedo montam um controle apertado em todos os acessos.
Festa de encerramento
Id-el-Fitr dá três dias seguidos de festa. É uma autêntica explosão de regozijo. aliás, todo o mês foi vivido em tom de festa. Um dos sinais inconfundíveis era o estralejar incessante de foguetes pela noite fora: espontâneo, individual, desordenado. a pequenada divertia-se com fazer rebentar bombas (como no nosso carnaval) ou então percorriam as ruas, em bandos, ao ritmo de tambores. Tudo muito para o ruidoso, talvez para não ficarem atrás do muezim que bombardeia sempre as redondezas com todos os decibéis do sistema sonoro.
Id-el-Fitr tem vindo a assumir muitos aspectos do nosso Natal comercial e consumista. até os enfeites luminosos nas janelas das casas, com luzes à nossa maneira a exibir motivos islâmicos, estão a impor-se cada vez mais. além de elevados gastos na comida, que é mais cuidada e abundante, não só na festa final mas ao longo de todo o Ramadão, vêm as guloseimas de todo o género, que os comerciantes põem bem à vista dos passantes e, se já são tentadoras assim, quanto mais para quem as contempla em jejum. Depois os brinquedos para as crianças e a roupa nova para toda a família e os presentes a oferecer. De facto uma das funções dos três dias de festa, com tempo abundante para passeios e visitas, é mostrar-se e fazer admirar as prendas que a festa trouxe.
De Jerusalém