«Que lhe acontecera para passar de uma vida cheia, para uma vida de destruição? Ninguém conseguia explicar»
«Que lhe acontecera para passar de uma vida cheia, para uma vida de destruição? Ninguém conseguia explicar»- Lucas está perdido; aquele rapaz nunca mais se levanta, O que ele era e o que é… muitos eram os comentários sobre Lucas. Carlos encontrou-o na distribuição de sopa aos sem-abrigo. Foi um choque: estava sentado no passeio, aguardando a chegada da carrinha. Falava sozinho, alheio a tudo à sua volta. Era a primeira vez que Carlos via o amigo naquele estado. Podia ajudar a renascer aquele homem que tinha uma capacidade enorme de criar alegria; que fizera programas de rádio para crianças; que fora um respeitado chefe de escutismo e que tinha para quem dele precisasse uma disponibilidade incondicional. Que lhe acontecera para passar de uma vida cheia, para uma vida de destruição? Ninguém conseguia explicar. Mas não era isso que importava. O urgente era ajudá-lo a reencontrar-se. Carlos evitou que Lucas o visse. Só serviria para o envergonhar. No dia seguinte, contactou os amigos do antigamente e combinaram um plano de ajuda. assim, logo pela manhã do sábado, um grupo de cinco amigos foi ao encontro de Lucas, onde costumava dormir: num alpendre de um edifício antigo, numa rua degradada da cidade. Surpreso, Lucas parecia perdido, descoberto na sua vergonha pelos amigos. Tentou esconder-se nos cobertores, mas em vão. Eles estavam determinados:- Hoje vens connosco. Vamos às urgências. Precisas ser internado. Estás muito doente. Não és homem para te deixares destruir pelo álcool. Hoje é dia de acordar!Lucas tentou justificar que não podia fazer isso mas os amigos não lhe permitiam recusas:- Se não aceitares, falamos com o Delegado de Saúde e és internado à força. Nessa mesma tarde, Lucas dava entrada no serviço de tratamento alcoólico, não por convicção, mas por falta de força para lutar contra aquele muro de amigos. E ao mesmo tempo, era tão bom ter alguém a importar-se consigo e a cuidar de si. Em todos os dias do internamento, a hora da visita era sagrada: algum dosamigos lá estava e levava outros com ele. Entre os mais importantes para Lucas, o irmão e os sobrinhos. Há quanto tempo se afastara… O choque inicial com a sua vergonha transformou-se em prazer de reencontro com quem lhe era querido, e até em orgulho pela sua nova imagem. Passado um mês, parecia o Lucas de antigamente: rindo, contando anedotas, recordando bons momentos do tempo em que se sentia com tamanho de gente. Voltou a falar de projetos, de desafios, a vida voltara a ter cor de esperança. Chegou o dia da alta: dia de festa! Mas todos sabiam que o maior desafio começava agora. Por isso, os amigos e a família mantiveram uma aliança protetora, organizando momentos de convívio e interajuda onde Lucas sobressaía e podia voltar a sentir o prazer de viver. O tempo passou e Lucas já não precisava da ajuda dos amigos para querer apostar na vida. Contudo, o grupo não se desfez – não por causa de Lucas mas por causa deles: ao ajudar Lucas cada um dos amigos redescobriu o sentido da vida em unidade e reencontrou-se com o melhor de si, gerando um renovado prazer de viver, em ligação harmoniosa com os outros. Lucas renasceu, mas eles também.