Natália era voluntária uma vez por semana na cozinha da cantina social. Quando preparava ou servia a refeição na cantina, sentia-se ainda mais viva, mais abençoada e agradecida. Era como se fizesse parte de uma família que abrangia todo o universo
Natália era voluntária uma vez por semana na cozinha da cantina social. Quando preparava ou servia a refeição na cantina, sentia-se ainda mais viva, mais abençoada e agradecida. Era como se fizesse parte de uma família que abrangia todo o universo a corrida de Natália foi compensada: apanhou o metro das 7h30. assim, podia ir sentada e ser pontual na chegada à casa da dona Luzia, como gostava. Observando-a, via-se uma senhora com expressão sorridente como se estivesse bem com a vida, indiferente ao cansaço físico acumulado. Natália era uma mulher feliz. Pousou as mãos sobre o regaço, descansando-as da atividade já realizada nessa manhã. Fez o almoço para o marido levar para o trabalho, acordou os filhos e preparou-lhes o pequeno almoço, deu o banho à mãe e deixou-a preparada para o marido a levar para o centro de convívio, e ainda teve tempo de fazer as recomendações habituais aos filhos e os aconchegar com o beijo de bom-dia. Este era o seu início habitual de dia. Sentia-se agradecida ao Deus em quem acreditava e por quem se sentia mimada. Dizia que tudo lhe corria bem: tinha uns filhos que eram o seu tesouro, um marido companheiro nos sonhos e nas lutas; a mãe, já velhinha, estava protegida em família; e tinha na sua patroa uma amiga que lhe garantia um salário seguro. Lá em casa não havia muito tempo livre. Todos estavam comprometidos com algum grupo na comunidade próxima. até a sua mãe fazia parte do clube das bonecas de trapos para angariar fundos para as famílias carenciadas. Natália era voluntária uma vez por semana na cozinha da cantina social. Quando preparava ou servia a refeição na cantina, sentia-se ainda mais viva, mais abençoada e agradecida. Era como se fizesse parte de uma família que abrangia todo o universo. alguém sentou-se ao seu lado. Natália ajeitou-se na cadeira e sorriu para a companheira de viagem. Percebeu nela um olhar cansado, entristecido, envolto em si mesma, quase como se não tivesse dado pela sua presença. Decidiu interromper aquele silêncio que parecia falar de algum tipo de sofrimento. Mas, com que justificação? De repente, lembrou-se:- Desculpe incomodá-la, mas tenho a responsabilidade de arranjar voluntárias para ajudar na cantina social da minha zona. Por acaso não gostaria de dar-nos uma ajudinha?- Porque me faz a mim um convite desses? Não me conhece!- Tem razão, mas ao olhar para si, senti que seria ótimo tê-la como colaboradora. Eu contribuo lá uma vez por semana. – Nunca ninguém achou que eu poderia ser útil para coisa nenhuma. Para dizer a verdade, nem eu mesma acho que possa valer para coisa alguma. O seu olhar sombrio não deixou dúvidas a Natália: quanto sofrimento! Insistiu:- Pois eu desafio-a a ver o contrário. Estamos mesmo a precisar de si, acredite! Seria excelente tê-la connosco. a senhora desconhecida vacilou com este convite invulgar logo pela manhã. – E que precisaria eu de fazer?- Poderei apresentá-la ao coordenador do projeto, que a esclarecerá. Depois, poderá decidir. – Vou pensar no seu convite. Mas, desde já, agradeço-lhe a sua confiança em mim. Natália reparou que os olhos da sua companheira de viagem tinham agora outra luz. anotaram números de telefone, cumprimentaram-se cordialmente e Filipa saiu na paragem seguinte. Pareceu a Natália que o passo de Filipa era dançante, sustentado por um novo desafio que lhe enchia a vida de mais sonho e de mais cor.