a conquista dos direitos sociais após o 25 de abril é algo que merece o aplauso e a gratidão do povo português. Contudo, os governantes «esqueceram-se» que as concessões sociais pagam-se e não pode ser à custa dos que menos têm
a conquista dos direitos sociais após o 25 de abril é algo que merece o aplauso e a gratidão do povo português. Contudo, os governantes «esqueceram-se» que as concessões sociais pagam-se e não pode ser à custa dos que menos têm

Os fundos de adesão da Comunidade Económica Europeia (UE), que o nosso país recebeu nos anos posteriores à sua integração de pleno direito, deveriam ter sido utilizados para preparar a economia portuguesa para o mercado global. No entanto, os sucessivos governos que ocuparam o poder não tiveram o cuidado de traçar planos adequados para tal, limitando-se a seguir as normas provindas de Bruxelas e que eram desajustadas no caso português.

Olhando para trás constatamos que uma parte substancial foi gasta com o desenvolvimento excessivo de novas vias, nomeadamente autoestradas, e que agora são autênticos elefantes brancos. Hoje restam as estradas, mas cada vez há menos carros a utilizá-las e os gastos exorbitantes que foram despendidos fazem falta a outros setores.

Paul Krugman, conhecido economista norte-americano, corrobora as conclusões de um estudo que sugere que, nem num cenário mais benigno, Portugal (e Grécia) poderiam regressar à dinâmica de endividamento que tinham antes da crise financeira de 2008/09, porque ela era, já de si, insustentável. a previsão do estudo alerta para que no prazo de dez anos, em 2021, a dívida estaria, em ambos os casos, acima ou perto do equivalente a 150% do PIB. Em 2014 o PIB português já vai nos 132%.

Foi exatamente por este motivo que Portugal teve que pedir ajuda, através do programa de resgate da troica, para que as contas públicas – e frisamos: públicas – entrassem por um caminho mais consentâneo com os gastos do país. Para atingir esse fim as instâncias europeias firmaram um acordo com o governo português e impuseram os caminhos a seguir. Parte das imposições foram cumpridas, mas outra parte (a mais importante) ficou no papel.

O documento elaborado pelos três organismos europeus para a concessão do empréstimo a Portugal previa vários itens que não foram sequer tocados. a negociação das parcerias público-privadas, as famosas PPP, que continuam a ser a chaga da economia portuguesa, e que se vai prolongar por décadas, foi apenas beliscada. E com que suavidade!

a alteração da lei dos municípios nem sequer foi iniciada, pois previa a extinção de grande parte das Câmaras, e isso não era conveniente para nenhum dos partidos políticos, mesmo fora da área do poder. O texto sugeria ainda que as despesas com o funcionamento do Estado sofresse cortes de molde a emagrecer o mesmo, mas também isso não sucedeu. Por outro lado era necessário encarar de frente o crescimento da economia portuguesa, mas aí falharam os organismos europeus e os responsáveis portugueses.como nada disto foi feito, o que restou para fazer? O Estado avançou para uma maior fiscalidade sobre os cidadãos, ou seja, passou a cobrar mais impostos (em crescendo e sem fim à vista) agravando as condições, já de si precárias, dos cidadãos da classe média-baixa.

Mas há outra classe de população de baixos rendimentos, ou mesmo sem eles, a quem o Estado concede apoios sociais, mas a tendência de aperto de regras, definida nos primeiros pactos de estabilidade e crescimento e depois acentuada com o período de vigência do memorando da troica, mostra claramente a sua quebra progressiva desde o verão de 2010.

Em quatro anos, cerca de um milhão de portugueses perdeu apoios sociais. Estamos a falar de abono de família, rendimento social de inserção (RSI), complemento solidário de idosos (CSI) e apoios a jovens com necessidades especiais. Tudo diminuiu nestes anos. E até nos subsídios de desemprego se notam as diferenças: quase metade dos desempregados já não tem subsídio,

ao nível dos abonos de família, há menos 666. 526 pessoas a receber este apoio. Já ao nível do RSI o valor desce em 312. 709 (para que se perceba, havia mais de meio milhão a recebê-lo em 2010, agora são cerca de 213 mil). Só aqui há cerca de um milhão de portugueses a receber menos apoios. as contas são do Público, que cita os números do Instituto de Segurança Social. Esta tendência contraria o senso comum, de que em época de crise mais pessoas receberiam apoios. Na realidade, é o contrário que se tem confirmado e é lamentável que tal aconteça.