«Uma escola com barreiras e que não vai ao encontro dos interesses e necessidades dos seus alunos só desperta neles um estado de Vigília e defesa e a vontade de fugir dela»
«Uma escola com barreiras e que não vai ao encontro dos interesses e necessidades dos seus alunos só desperta neles um estado de Vigília e defesa e a vontade de fugir dela»No inverno passado ‘fugi’ para a escola (neste caso a Faculdade) e assumi novamente o papel de aluno, no curso de Especialização em Educação Especial. Foi gratificante. Porquê? Porque gostei de lá estar e porque lá encontrei o que precisava, à minha medida. Durante alguns meses voltei a ter aquilo que é quase privilégio exclusivo dos alunos: as melhores fontes de conhecimento e experiência em versão humana à minha disposição e um contexto heterogéneo, potenciador de partilhas e aprendizagens. Os conhecimentos que adquiri ao longo do curso implicaram uma observação mais atenta sobre a forma como as Escolas e os Museus se relacionam e praticam a inclusão. O conceito fugir para a escola do professor Jorge Castro e que serve de lema da Escola Profissional de aveiro parece, a meu ver, simples e certeiro quanto ao que é preciso fazer nas escolas, nos museus, em qualquer lugar. Gostar do lugar onde estamos é condição indispensável para aprender. Uma escola com barreiras e que não vai ao encontro dos interesses e necessidades dos seus alunos só desperta neles um estado de vigília e defesa e a vontade de fugir dela. Fugir para a escola é bem diferente de fugir da escola. Tentaria fugir da escola se a mesma não servisse os meus interesses, se não me disponibilizasse as ferramentas de que preciso para aceder a determinado conhecimento, se não me motivasse. Tornar uma escola ou qualquer outro local agradável e potenciador de aprendizagens é indissociável de o tornar igualmente inclusivo, pois só desta forma ele pode fornecer as diferentes ferramentas a que diferentes alunos fazem apelo. E os museus? São espaços para onde apetece fugir? Tornaram-se espaços agradáveis e inclusivos, ou seja, para todos? Quando iniciei o curso, tinha a ideia de que a maioria dos museus trabalha os conhecimentos sobre o seu espólio com a produção de soluções em série, estandardizadas, desarticuladas da realidade escolar, que depois são servidas de forma igual a alunos que são tão diferentes. O trabalho da pós-graduação, com crianças da educação especial e as visitas de estudo que realizei nos últimos meses a diferentes espaços museológicos fizeram mudar um pouco a visão preconceituosa com que o iniciei. Se é verdade que haverá ainda museus que vivem distantes da realidade escolar e que oferecem todos os dias o mesmo menu de carne a públicos onde também existem vegetarianos, apreciadores de peixe e pessoas com dificuldade em comer, também é verdade que já serão menos os espaços museológicos a proceder dessa forma. Fiquei com a sensação de que a perspetiva museológica quanto à inclusão tem vindo a mudar. alguns museus já atendem ao facto de que somos todos diferentes, todos diferentes e já se preparam para receber todo o tipo de públicos e fornecer as ferramentas que cada um precisa. Fiquei positivamente surpreendido com o trabalho desenvolvido por alguns museus que enfrentam realidades distintas. O Museu Concelhio da Comunidade da Batalha (MCCB), pela forma como foi tecnologicamente preparado de raiz para atender às características de todos os que o visitam, sejam cegos, surdos, tenham perturbações intelectuais ou motoras. O Museu de arte Sacra e Etnologia de Fátima (MaSE), pela forma corajosa como o seu serviço educativo acedeu à proposta de deixar trabalhar uma pequena parte do seu espólio por uma turma de um curso profissional da Escola Secundária de Gondomar, que preparou jogos pedagógicos para alunos com necessidades educativas especiais e ainda pelo facto de ter adequado o discurso e a parte mais expositiva da visita com esses alunos de uma forma que considerei brilhante. Foi, para mim, uma prova de que mesmo sem os recursos técnicos e tecnológicos ideais podemos tornar os espaços museológicos agradáveis e acessíveis a todos. Para não ser acusado de regionalismo, vamos mais a norte, ao Museu dos Transportes e Comunicações do Porto (MTC). aí destaco a forma como, com o mesmo espólio, se podem servir refeições diferentes e adequadas a cada um. No espaço de três meses, participei duas vezes na mesma oficina, Sentidos alerta, com turmas e temas bastante diferentes e a verdade é que as abordagens foram também muito distintas e adequadas ao que se trabalhou em contexto de aula. ao resultado final que se obteve nos três museus não foi alheio o facto de a escola ter comunicado e articulado bastante com os mesmos, dando indicações dos temas, mas também das características específicas dos alunos, das formas de aprendizagem mais significativas e adequadas e, no caso do Museu de arte Sacra e Etnologia de Fátima, ter trabalhado previamente parte do espólio em contexto de aula. Concluindo, e lembrando o que o professor Celso Oliveira referiu numa das aulas a que tive o prazer de assistir, é muito importante trabalhar de forma a não entregar os nossos alunos às escolas e museus, mas integrar e sobretudo incluir. Penso que é na diferença que reside a riqueza humana e a igualdade apenas deve ser reclamada nas oportunidades que todos merecem ter, precisamente por sermos diferentes. Espero que escolas e museus continuem o seu trabalho e consigam fazer dos seus espaços físicos locais tão agradáveis como foram para mim aqueles onde aprendi tanto nestes últimos meses. *Docente de História