Como muitos outros, entrei para o escutismo inspirado por um irmão mais velho. O Mário que, desde adolescente, sonhava «entrar para os escuteiros», tal como os amigos da sua turma do liceu
Como muitos outros, entrei para o escutismo inspirado por um irmão mais velho. O Mário que, desde adolescente, sonhava «entrar para os escuteiros», tal como os amigos da sua turma do liceu

Nunca chegou a fazê-lo quando era adolescente mas, já na idade adulta, não aguentou mais o apelo e embarcou no projecto de criar um agrupamento na nossa freguesia natal. Eu, que desde pequeno, me maravilhava a ouvir o meu irmão mais velho falar dos acampamentos, das fogueiras e aventuras dos amigos e em que ele desejava ardentemente participar, e sempre desejei fazer parte dessa tropa, não perdi a oportunidade de, a ele, me juntar.

Iniciei a actividade escutista como caminheiro no Clã, do agrupamento 127 Sé, numa espécie de estágio. ainda hoje, recordo a emoção de ir comprar a farda nova e dos primeiros tempos, ainda sem lenço rubro ao peito, mas cheio de orgulho por vestir o caqui e azul do CNE. Fi-lo com o melhor grupo de escuteiros do mundo, outros jovens que, tal como eu, abraçaram o desafio lançado pelo Mário de seguir as pegadas de Baden-Powel e deixar o mundo um pouco melhor.

Foram tempos de experimentação, felicidade, novos conhecimentos, convívio, abertura de horizontes e mentalidades e, claro, muita discussão, amizade e trabalho em equipa. Largávamos os estudos e o trabalho para passar o fim-de-semana a aprender a fazer nós e amarrações, a cortar madeira e a ajudar os outros, sempre com um sorriso e com o Serviço no coração. Quando saímos do 127, rumámos à Boa Vista para fundar o 1227.

Nos escuteiros, cresci. Crescemos todos. alguns dos meus companheiros saíram do CNE, mas muitos ficaram. Deixamos de ser escuteiros para ser chefes escuteiros. aumentou a responsabilidade e aumentou também o trabalho. Mas, nós, nunca desanimámos, mesmo nas mais acaloradas discussões à volta da mesa da direcção. ajudámos a formar dezenas de jovens. acertámos sempre? Talvez sim, talvez não. Mas sempre o fizemos da melhor vontade, abdicando do nosso tempo, penalizando as nossas famílias, mas convencidos da validade da nossa missão.

Os anos que passámos com as crianças e jovens da primeira, segunda, terceira, quarta e quinta secções convenceram-me da boa vontade dos dirigentes, da nobreza que é cuidar das quatro primeiras e a dor de cabeça que é a última. a quinta é, bastas vezes, demasiadas vezes, dada a irreflectidos conflitos de egos e até de simpatias.

Talvez tivesse sido melhor o CNE ter focado a sua atenção no problema das vocações escutistas, pouca renovação entre os dirigentes e mau cumprimento da pedagogia na IV secção do que para reformas pedagógicas facilitadoras e simplificadoras. Quem, dentro do CNE, não conhece caminheiros que, ao abrigo da inventada figura da Comissão de Serviço, não tiveram oportunidade de fazer a caminhada dentro da sua secção e pedagogia, vorazmente utilizados para tapar os buracos da ausência de dirigentes nas secções mais jovens? Mas, essa é a minha opinião que, sei, é partilhada por muitos dirigentes e ex-dirigentes.

Complicações à parte, jamais esquecerei os meus escuteiros. Os jovens com quem cresci e aprendi a liderar, sem usar do posto, tratando-os como meus iguais.como irmãos mais novos. Passei pelo 127, ajudei a fundar o 1227, continuei a minha carreira escutista no 1198, ajudei a formar outros dirigentes, participei e montei acampamentos nacionais, regionais e internacionais. Fui chefe emprestado ao 1209, ajudei e continuo a ajudar os meus irmãos escuteiros, sempre que sou solicitado.
O Corpo Nacional de Escutas foi o sítio onde verdadeiramente cresci como pessoa e adulto. Por lá, encontrei muitas pessoas boas e algumas más, como aconteceu noutras situações da vida pessoal e profissional. Os meus colegas de trabalho continuam a chamar-me de escuteirinho, embora, para minha pena, já não faça, efectivamente, parte dessa irmandade. Não lhes levo a mal. Pelo contrário, é motivo de grande orgulho. Ser escuteiro fez e fará sempre parte de mim. Continuo a recordar, em conjunto com os meus companheiros de caminhada e de vida, todas as aventuras passadas, certo que, nas futuras peripécias, haverá sempre um pouco de espírito de escuteiro em mim. *Jornalista (O autor escreve segundo a anterior norma ortográfica)