O Centro Social e Paroquial de São Vicente de Paulo tem conseguido resistir às convulsões sociais e políticas e assume-se hoje como uma instituição que está na vanguarda no apoio social a crianças, idosos e deficientes
O Centro Social e Paroquial de São Vicente de Paulo tem conseguido resistir às convulsões sociais e políticas e assume-se hoje como uma instituição que está na vanguarda no apoio social a crianças, idosos e deficientesEncaixado entre dois bairros esquecidos pelo poder político e nem sempre bem frequentados, na zona periférica da cidade de Lisboa, o Centro Social e Paroquial de São Vicente de Paulo exibe-se, imponente, como uma espécie de oásis da solidariedade social. as paredes de branco imaculado, em contraste com os grafitis revolucionários distribuídos de forma anárquica pelas construções circundantes, espelham bem o respeito que os habitantes dos bairros da Serafina e da Liberdade nutrem por esta obra, construída a pulso, ao longo dos últimos 55 anos. Os alicerces foram lançados pelos Vicentinos, nos idos anos 20 do século passado, mas foi a chegada do missionário da Consolata, padre José Gallea, em 1958, que deu um importante impulso ao projeto. Visionário e dinâmico começou por criar as primeiras respostas sociais, servindo-se de pré-fabricados para acompanhar crianças, jovens e adolescentes carenciados. Tinha o sonho de erguer uma obra que respondesse às necessidades da população, naquele tempo afetada pela fome e pela falta de assistência médica. Mas conseguiu deixar apenas uma semente do fruto que pretendia ver prosperar, pois em 1961 foi transferido para outras paragens. Seguiu-se um período de degradação da obra já construída, devido à mudança sucessiva de párocos, até que, na revolução de abril, os movimentos extremistas se apoderaram das instalações, deixando pouca margem de manobra aos sacerdotes ali colocados. Quando Francisco Crespo, missionário da Consolata, chegou à paróquia, em 1977, encontrou um cenário desolador. Não havia ninguém que quisesse aqui ficar, estava tudo destruído e era preciso começar do zero, recorda o agora cónego e diretor do Departamento da Pastoral Sócio-Caritativa do Patriarcado de Lisboa. Consciente de que o caminho teria de ser feito por etapas, identificou prioridades e, um ano depois, com a ajuda da Cáritas, tinha a funcionar um pré-fabricado para acolhimento de idosos, um serviço que viria a dar origem ao primeiro Centro de Dia do país. Seguiu-se um espaço provisório para as crianças em idade pré-escolar, em parceria com a Santa Casa da Misericórdia, até à construção de raiz de um jardim de infância, com aTL (Centro de atividades de Tempos Livres), e a criação de um movimento juvenil. Caridade com qualidade À medida que o complexo crescia, os bairros definhavam, muito por culpa da construção da Ponte 25 de abril e da abertura do Eixo Norte-Sul. as habitações, na sua maioria, transpiravam humidade e iam-se revelando um depósito confrangedor de idosos dependentes e solitários. Francisco Crespo sentia-se incomodado: Entrávamosnas casas e ficávamos admirados como se conseguia viver assim. Era preciso fazer uma coisa a sério. Nasce então o lar para a terceira idade. Não satisfeito, e movido pelo lema pastoral por amor, o cónego construiu ainda uma creche e um lar para deficientes adultos, muitos deles resgatados das ruas, vítimas de abandono e maus-tratos. O corolário de toda esta obra surge com uma última construção: uma igreja de linhas arquitetónicas simples, mas com capacidade para 500 pessoas. De um lado está Cristo que vence, que evangeliza, do outro está todo o exercício da caridade, explica o pároco de São Vicente de Paulo, para justificar a implantação do templo num lado e de todas as outras valências no lado oposto do complexo. Quem entra neste Centro, dificilmente se apercebe que foi construído por fases, muito menos da sua capacidade de acolhimento. Mas o facto é que, neste momento, os 170 funcionários da instituição cuidam de 790 utentes, dos mais novos aos mais velhos, e asseguram o fornecimento de 1. 200 refeições diárias. Quando se pergunta como foi possível erguer tamanha obra, em contextos sociais e económicos quase sempre desfavoráveis, Francisco Crespo encolhe os ombros e responde de forma desconcertante: Não posso dizer porque não sei. É daquelas coisas a que chamamos milagre. a verdade é que investi aqui milhões, não pedi um tostão ao banco, não devo nada a ninguém e nunca passei noites sem dormir, preocupado com a forma como havia de pagar. Por isso, é um autêntico milagre, ou de São Vicente de Paulo ou de Nossa Senhora da Consolata. Em jeito de conclusão, o cónego Crespo traça as linhas com que se cose o dia a dia do Centro Social e Paroquial de São Vicente de Paulo, essa espécie de paraíso social da freguesia de Campolide. a única coisa que me preocupa agora é procurar que o serviço de caridade seja feito com qualidade, que as pessoas sejam bem assistidas, bem acompanhadas, e que haja aqui respeito, formação humana, social e cristã.