São mais de uma centena os países onde a malária ainda é endémica. E por ano morrem umas 660 mil pessoas com a doença, sobretudo crianças
São mais de uma centena os países onde a malária ainda é endémica. E por ano morrem umas 660 mil pessoas com a doença, sobretudo criançasEnquanto não chega a primeira vacina, prometida para 2015, todos os meios são úteis para reduzir a mortalidade: redes mosquiteiras, desinfestação das casas, medicamentos antipalúdicos. Em África, continente mais afetado, as modernas tecnologias também dão uma ajuda. E nesse campo o telemóvel está de parabéns. Uma aldeia da Nigéria igual a tantas outras em África: nenhuma farmácia no raio de centenas de quilómetros, medicamentos à venda na rua entre garrafas de lixívia e frascos de champô.como conta a repórter Chloé Hecketsweiler, do jornal francêsLe Monde’, um terço dos remédios são de contrafação, que ou não curam nada ou até matam. agora, graças a uma empresa informática americana, a Sproxil, e à iniciativa do governo nigeriano, basta enviar um sms com o código da embalagem de comprimidos antipalúdicos para receber em alguns segundos a certeza de que se trata de um medicamento legal. Os grandes laboratórios mundiais apoiam o método, que já foi utilizado por seis milhões de pessoas no mais populoso dos países africanos(e também o mais afetado pela malária, com um quarto dos casos). Quantas vidas terão sido salvas é uma incógnita. Milhares?Recorrer ao telemóvel é do mais natural em África, por muito que possa surpreender. O continente nunca chegou a ter boas redes fixas e telefone mas, graças aos satélites, as comunicações móveis são um sucesso e servem para quase tudo, até para transferir dinheiro de emigrantes para as suas famílias que ficaram na aldeia natal. Para 1100 milhões de africanos, calcula-se que existam hoje 800 milhões de telemóveis esmartphones’. Não por acaso, o avultado prémio de boa governação de África, para líderes que deixaram o poder de bom grado, foi criado pelo sudanês Mo Ibrahim, que se tornou milionário graças à sua empresa de telecomunicações. O telemóvel está a ser usado também em África para apurar os casos de malária em cada região de forma a governos, como o da Tanzânia, gerirem osstocks’ de medicamentos de forma eficaz. No Senegal, nos Camarões e no Chade, um outro programa inovador consiste em enviar um sms noturno a alertar para se dormir sob uma rede mosquiteira, em especial a crianças. Transmitida por um parasita e propagada por mosquitos, a malária tem vindo a conhecer um recuo importante de há um século para cá. Hoje os países afetados são os de África, com raras exceções, os da américa Latina(tirando Chile e Uruguai), e quase todos os asiáticos. Na Europa só a Turquia e alguns países do Cáucaso continuam infetados. Portugal, por seu lado, identificou os últimos casos em meados do século XX, apesar de muitas pessoas (incluindo militares que estiveram na guerra do ultramar) que vieram das ex-colónias africanas sofrerem durante anos crises de paludismo por causa de infeções lá contraídas. Paludismo e malária são dois nomes para a mesma doença, a que se pode somar um terceiro em desuso: sezões ou sezonismo. Nos últimos anos o surgimento de novos medicamentos fez da forma mais comum de malária uma doença facilmente curável, o que torna ainda mais absurda a demora em erradicar. Há uma questão de dinheiro a ter em conta, apesar de, desde 2000, as verbas envolvidas terem passado de 35 milhões de dólares para os atuais 2,5 mil milhões. Desde a ONU até fundações privadas, como a de Bill Gates, o pai da Microsoft, passando por diversos governos, hoje são muitas as entidades comprometidas com o combate à doença. as consciências terão sido despertadas por um relatório, há 13 anos, da OMS a afirmar que um quarto da riqueza potencial de África desde a descolonização nos anos 1960 e 1970 tinha sido perdido por causa do paludismo que mata, enfraquece e desmotiva muitas populações no continente, sobretudo a sul do Sara. Na época, a diretora-geral da OMS, a norueguesa Gro Harlem Brundtland, não se cansava de repetir que o paludismo impede uma melhoria do nível de vida das gerações futuras. Redes mosquiteiras oferecidas têm sido um sucesso. O seu custo de mercado, na ordem dos quatro euros, é demasiado para muitas famílias africanas e por isso as ONGs dão um enorme contributo para salvar vidas. Também o preço dos antipalúdicos tem vindo a baixar e há o bom exemplo dos suíços da Novartis, que venderam 600 milhões de embalagens de Coartem’ a preço de custo(um euro no caso dos adultos, 50 cêntimos na versão pediátrica). Outros laboratórios, como os indianos da Cipla e os chineses da Guilin, estão também a apoiar o combate à malária, abdicando nesta matéria dos fabulosos lucros que a indústria farmacêutica costuma obter. Falta, porém, ainda mais dinheiro. Dos governos, mas também dos beneméritos em geral. E o telemóvel volta a destacar-se. Uma ONG americana, a Malaria No More, tem uma aplicação parasmartphone’ que permite a quem doar dinheiro para a luta contra o paludismo seguir em tempo real o milagre que os seus dólares ou euros estão a fazer numa qualquer aldeia africana.