Perdoar uma dívida impossível de pagar é sempre louvável. No entanto, basta olhar para o caso de Moçambique para ver que o mais difícil vai ser garantir o bom destino desse dinheiro.
Perdoar uma dívida impossível de pagar é sempre louvável. No entanto, basta olhar para o caso de Moçambique para ver que o mais difícil vai ser garantir o bom destino desse dinheiro. Nos últimos tempos o acontecimento mais divulgado e acolhido com sincera alegria é a notícia do perdão da dívida externa de Moçambique. Sem dúvida esta decisão, que parece ser incentivada pelos Estados Unidos e Reino Unido, é um passo gigantesco para o desenvolvimento dos países considerados pobres.com Moçambique, há mais 17 países que beneficiarão da medida. Não é somente uma iniciativa boa, mas é sobretudo justa. Não tem lógica nenhuma oferecer, com a mão direita, as chamadas “ajudas humanitárias” e, com a mão esquerda, exijir “juros de opressão” aos mais pobres do nosso planeta.
Porém, “não há bela sem se não”. Se o perdão da divida servir para a criação de uma nova dívida, é melhor não perdoar e habituar esses países a serem adultos e começarem a contar com as próprias forças. Vejamos porquê. Todos os países funcionam no sistema do débito e do crédito. Não são somente os países considerados pobres que têm “dívida externa” ou que “devem a outros países”. é um fenómeno mais extenso. Infelizmente a questão da economia mundial é um assunto misterioso, ao qual muitos de nós não temos acesso.como funciona a bolsa? Os câmbios de moeda? a avaliação da riqueza de um país? Quais os critérios que guiam o banco mundial? Estes e outros assuntos da Política mundial e das Nações Unidas são coisas, que, com grande pesar, ainda escapam à minha limitada compreensão. Também os critérios de atribuição de certos prémios e certos cargos são para mim ininteligí­veis. Espero que outros mais esclarecidos e mais qualificados consigam em tudo isto encontrar uma certa lógica e um sentido do verdadeiro e do certo.
Estávamos a falar da dívida dos países pobres. Se o perdão servir somente para a criação de uma nova dívida, este perdão é inútil. a grande pergunta que me ponho é: onde foi parar o dinheiro que chegou a estes países como empréstimo? Para o melhoramento e a construção das infra-estruturas necessárias ao país não foi de certeza. Para a compra de armas? Talvez. Para o enriquecimento de uma pequena minoria de abutres e chacais? Com certeza.
Portanto políticos corruptos, perdoem a dívida e concedam outra, de maneira a poderem comer ainda mais com os vossos congéneres destes lados. Um empréstimo ninguém o controla, ninguém pede contas e, portanto, todos podem tirar da panela. Entretanto o povinho paga com os impostos.
Se querem uma ideia positiva, olhem para o exemplo da Espanha. Moçambique tem uma dívida com a Espanha. a Espanha não perdoou a dívida, mas os juros que Moçambique deveria pagar cada ano são investidos na educação e na saúde. Uma organização espanhola a trabalhar aqui em Moçambique, sobretudo nas províncias do norte mais desfavorecidas, supervisiona o investimento deste fundo criado com o dinheiro destinado à amortização da dívida. O governo moçambicano não é obrigado a pagar este fundo à Espanha, desde que o invista no desenvolvimento, sobretudo nas áreas da saúde e da educação. a organização de voluntários espanhóis verifica se o dinheiro vai para os sítios certos.
Querem perdoar a dívida aos países pobres? Muito bem. é uma iniciativa digna e nobre. Porém não deixem a corrupção sujar a única coisa boa que ainda nos resta como humanos: a solidariedade. Saber que há gente que se aproveita do sofrimento dos outros, por vezes de povos inteiros, é uma coisa que tira a vontade de viver. Obriguemos os governantes a servir os seus povos e não a servir-se deles. Governantes amem os vossos povos! O ditador mais desumano é aquele que rouba o pão de quem pouco ou nada tem (cfr. 1Sam 12,1-23). Não há maior massacre do que lobos a fingir de pastores de ovelhas.