Os missionários «não são mais os omniscientes salvadores da pátria, mas irmãos que partilham a caminhada do Reino de Deus que acontece na ferialidade da vida», considera Gianfranco Graziola, em missão no Brasil
Os missionários «não são mais os omniscientes salvadores da pátria, mas irmãos que partilham a caminhada do Reino de Deus que acontece na ferialidade da vida», considera Gianfranco Graziola, em missão no BrasilQuando se fala de missão pensa-se em aventuras extraordinárias, em histórias, em eventos onde há sempre um herói para quem olhar e pelo qual se pode apaixonar. a missão hoje tem outro horizonte, fala outra linguagem, sobretudo num contexto como o da américa Latina onde, o papel dos países emergentes, como é o caso do Brasil, exige ultrapassar clichés tradicionais. Exige enfrentar os novos desafios que os povos nativos e as culturas tradicionais têm pela frente, um pouco devido aos grandes empreendimentos do Plano de aceleração ao Crescimento – PaC, aos quais se juntam neste momento as gigantescas obras da Copa do Mundo 2014 e das Olimpíadas de 2016. as migrações do campo para cidade, o abandono forçado dos povos nativos do seu ambiente natural, a precariedade da vida social, o aumento da violência e as grandes e graves injustiças obrigam o missionário a envolver-se nos campos da justiça e paz e dos direitos humanos. Foi o que aconteceu na minha história de vida e nos 12 anos de Roraima e Brasil que tenho.comecei a minha experiência brasileira e latino americana numa paróquia do interior no meio de colonos para depois passar em poucos dias a realidade fascinante e desafiadora do povo Yanomami, com a aprendizagem da língua como porta para entrar, tirando as sandálias, num universo totalmente diferente e ao mesmo tempo rico de emoções e sentimentos e onde a vida tem outra cor, outro ângulo de observação, outra visão. Quatro anos mais tarde, quando começava a saborear a beleza e a riqueza da filosofia do bem viver, foi-me colocado outro desafio missionário: deixar o universo Yanomami para uma nova experiência na área da justiça e paz. a linguagem era totalmente diferente, mas o mais desafiante era construir e entender, e ainda hoje o é, o que significa dedicar-se e trabalhar as dimensões da justiça e paz, dos direitos humanos e das realidades sociais com as quais se confronta a caminhada dos missionários e missionárias, mas também dos cristãos em geral. após seis anos nesta experiência nada fácil, posso dizer que hoje, como nunca, é importante trilhar os caminhos da justiça e da paz assim como o dos direitos humanos. Por isso é preciso deixar-se desafiar, derrubar muros e cercas que constantemente construímos, deixar o mundo da cristandade, das certezas, da paroquialidade para nos aventurarmos nos novos areópagos da missão onde as pessoas lutam no dia a dia por ver reconhecidos seus direitos, para uma vida digna, por outro modelo de sociedade mais humana e democrática. Eis porque hoje estou convencido que a missão tem a linguagem dos conselhos paritários, da participação na construção de um novo modelo de Estado, de uma formação e consciência cidadã onde nós missionários não somos mais os omniscientes salvadores da pátria, mas irmãos que partilham a caminhada do Reino de Deus que acontece na ferialidade da vida e tem vitórias e derrotas e o diferencial de uma fraternidade universal.