«Porque não há nada escondido que não venha a descobrir-se, nem há nada oculto que não venha à luz» (Mc 4, 22)
«Porque não há nada escondido que não venha a descobrir-se, nem há nada oculto que não venha à luz» (Mc 4, 22)Os últimos tempos têm mostrado a verdade desta afirmação. Múltiplos casos de pessoas, sobretudo poderosas, pretenderam mostrar-se diferentes do que são, ocultar atos censuráveis ou enveredar por negócios de reduzida transparência. Esses depois viram tudo isso nas primeiras páginas dos jornais e, pior, obsessivamente analisado e espiolhado por muitos, incluindo agentes da autoridade. assim se cria a longa sequência de escândalos que nos tem ensombrado. O clima de crise propicia este tipo de situações e provavelmente o surto deve-se apenas a isso. De facto é difícil provar e ocioso discutir se hoje as pessoas são mais ou menos atrevidas ou desonestas que em épocas passadas. Também pode acontecer, como dizia Chesterton, que o mundo não esteja pior, mas sejam os jornais que estão melhores. O que não há dúvida é que os casos de escândalos de vária ordem têm-se multiplicado a vários níveis. O primeiro elemento que surpreende é que alguém tente uma coisa dessas. Há até casos incríveis, em que o atrevimento parece inacreditável.com frequência são pessoas que até tinham uma carreira bem orientada e deitam tudo a perder com um risco inútil e desnecessário. Isto é um bom aviso. Sabemos como as circunstâncias podem embrulhar qualquer um numa espiral de males que leva à perdição: a todo aquele que tem, há de ser dado, mas àquele que não tem, mesmo aquilo que tem lhe será tirado (Lc 19, 26). Em seguida coloca-se a questão de saber como os cristãos devem enfrentar coisas destas. aí há vários cuidados a ter. Devemos começar pela consciência de que existe uma concupiscência dos olhos (cf. 1Jo 2,16), que nos delicia na contemplação do mal alheio. Muita gente peca por procuração, saboreando a miséria de histórias que nunca se atreveria a cometer. a imprensa aproveita-se disto para o obsessivo relato dos pormenores dos casos, assim gerando uma indústria de pecado enlatado, que se pode consumir de forma asséptica no conforto do lar. É decisivo repudiar essa atividade. Uma coisa é a saudável denúncia do mal, que deve ter sempre por finalidade o bem comum e nunca esquecer a caridade para com os acusados. Outra é a orgia de acusações e calúnias com que os novos meios de comunicação nos inundam diariamente. Basta ver-nos a nós ou a alguém que conheçamos tratado desta maneira para tomar consciência da extrema violência e injustiça deste processo, para mais feito em nome da equidade. Muitos até invocam a expulsão dos vendilhões do templo para envolver Jesus nas suas indignações. Mergulham em pleno no caudal de injúrias contra quem discordam, anunciando fazê-lo em nome d’aquele que usou o chicote de cordas em Jerusalém. Esquecem que a razão desse comportamento tão insólito do sempre pacífico Jesus era: O zelo da tua casa me devora (Jo 2, 17, cf. Sl 69(68),10). Ou seja, só por graves ofensas ao altíssimo Jesus fez o que apenas fez uma vez. Invocar esta história para justificar os nossos chicotes é fazer da casa de Deus um covil de ladrões. O mundo tem muito mal, como sempre teve. a nossa atitude deve ser a de anunciar a alternativa salvadora e ser já presença viva dela no mundo contemporâneo.