Eduardo Paulo Cunhane tinha onze anos, quando assistiu ao massacre de mais de 20 catequistas, no Centro Catequético de Guiúa, em Moçambique. é a única testemunha ocular do ataque
Eduardo Paulo Cunhane tinha onze anos, quando assistiu ao massacre de mais de 20 catequistas, no Centro Catequético de Guiúa, em Moçambique. é a única testemunha ocular do ataqueEm março de 1992, durante a guerra em Moçambique entre as tropas governamentais e a RENaMO, houve um ataque ao Centro Catequético do Guiúa, diocese de Inhambane onde foram mortos mais de vinte catequistas que estavam ali a frequentar um curso de atualização. Eram catequistas a tempo inteiro, geralmente marido e mulher, que levavam os filhos consigo. O Eduardo Paulo Cunhane tinha então onze anos, era filho de um desses casais e estava presente quando aconteceu o ataque. alguns anos depois fez o seu depoimento como única testemunha ocular dos acontecimentos para inserir no processo de beatificação dos Mártires do Guiúa entre os quais se encontra sua mãe. Eis um extrato do depoimento: Estava ainda a dormir quando o meu pai bateu à porta do quarto dizendo muito aflito; Eduardo, Eduardo, acorda, estamos a ser atacados. acendi a luz, levantei-me e vi, pela janela, homens com as armas apontadas contra mim. Desliguei a luz e escondi-me na casa de banho, de onde ouvia o que eles diziam e via o que faziam. Gritavam ameaças, entravam nas casa tiravam o que lhes convinha e destruíam o que não lhes servia. Pensei que não estava ali seguro e tentei fugir. Fui agarrado por um dos chefes que me disse: Você é meu, vamos. E a partir daquele momento fiquei sob o seu domínio enquanto estive com eles. Tiraram-me a camisa e os sapatos, ficando apenas com os calções em cima do corpo. Depois de darem a volta por todas as casas dos catequistas, juntaram as pessoas todas e levaram-nos para fora do Centro e obrigaram-nos a marchar em direção ao oceano. a certa altura mandaram-nos para debaixo de uns cajueiros e foi ali que presenciei cenas horríveis: interrogatórios, torturas, violações de mulheres. Queriam arrancar à força informações sobre a posição das tropas governamentais. Separaram as pessoas em três grupos: homens de um lado, mulheres do outro e um pouco mais afastadas estávamos nós, as crianças, mais ou menos da minha idade. Meu pai tinha conseguido fugir. Embora a certa distância, eu tenha conseguido localizar a minha mãe que trazia com ela a minha irmãzinha Tamara, de dezasseis meses. Deram-nos ordem de nos voltarmos para o outro lado e de nunca olharmos para onde estavam os homens e as mulheres. Não obstante essa ordem eu procurei maneira de observar o que iria acontecer à minha mãe. Fizeram-lhe o mesmo que já tinham feito a outras mulheres e outros homens. Davam-lhes com uma barra de ferro na cabeça e depois acabavam da os matar com as baionetas. Foi assim que vi matarem a minha mãe. a menina foi ferida com vários golpes na barriga, mas conseguiu sobreviver. Embora muito contristado e aflito preferi sufocar o choro e engolir as lágrimas para que eles não me matassem também a mim. De facto, em casa tinham-nos dado estas instruções: ‘Mesmo que vejam matar alguém na vossa frente, mesmo que seja uma pessoa de família, não devem chorar senão matam-vos também a vocês; nunca chorem nem gritem’.