Uma visita a uma aldeia da província de Niassa, em Moçambique, onde ninguém tinha visto ainda um padre, transformou-se numa lição de vida para o missionário da Consolata, João Baptista Coelho
Uma visita a uma aldeia da província de Niassa, em Moçambique, onde ninguém tinha visto ainda um padre, transformou-se numa lição de vida para o missionário da Consolata, João Baptista CoelhoHá tempos, visitei em Moçambique, precisamente na Província de Niassa, a aldeia de Mepapa onde os leprosos eram numerosos. Nunca lá tinha estado um padre, nem um médico nem ninguém que se interessasse por eles. Parei o carro debaixo de uma grande árvore, (nas aldeias há sempre uma árvore grande), considerada árvore sagrada, onde todos se juntam para conversar. Não tardou a juntar-se uma chusma de garotos à volta do carro, pois nunca lá tinham visto nenhum sacerdote e, para muitos deles, era também a primeira vez que viam um homem branco. Não ficaram, porém, muito admirados nem assustados. Via-os serenos e tranquilos à minha volta. Entabulei conversa com eles e depressa nos entendemos. Levava um saquito com rebuçados que comecei a distribuir. alguns nunca tinham visto tal coisa e perguntavam uns aos outros o que era aquilo e para que servia. Depressa aprenderam. Mas eu estava mais interessado em ver os doentes. Os que ali vieram, estavam sãos. acompanhava-me um catequista que também servia de intérprete quando fosse preciso. Os próprios garotos nos conduziram onde moravam os mais doentes. a primeira casa foi a de uma velhinha que não tinha absolutamente nada. arrastou-se pelo chão para chegar à porta da cabana onde vivia. Perguntei o que precisava e a resposta foi: ‘De tudo, mas especialmente de uma manta’. Era por demais evidente. Dali seguimos para outro doente. Encontrava-se num estado horroroso. Dava impressão olhar para ele e ouvi-lo. Falava bem português. Diante da casa havia uma pequena horta cultivada com milho, mandioca, abóboras, etc. Perguntei-lhe como é que ele conseguia cultivar a horta se estava assim tão doente e nem podia andar. Resposta dele: Eu pago a quem me faz o trabalho. E onde vai buscar o dinheiro? – perguntei. ah! senhor padre, aqui não há dinheiro. Vem aqui alguém capinar e eu dou-lhe uma mandioca; outro vai-me buscar água ao rio e eu dou-lhe uma maçaroca, é sempre assim; dinheiro nós não temos. Mais à frente estava uma senhora também doente, sentada no chão com as pernas estendidas para a frente. Não era velha e apresentava-se bem vestida com um vestido bom e limpo. Estava mergulhada numa tristeza tão profunda que nem falava. Tive a impressão que aquela sua tristeza era por se sentir leprosa sendo ainda bastante jovem. Enquanto a observávamos, aproximou-me junto dela um menino de cerca de sete anos que era um seu neto. Qual não foi a minha admiração e a minha comoção quando reparei que aquele menino estava a entregar à avó os rebuçados que antes tinha recebido junto ao carro. Mas que lições recebi naquele dia eu que pensava que iria ensinar alguma coisa aos leprosos!