a notícia sobre o dia dos missionários mártires fez-me recordar um episódio digno de ser registado pelo bom exemplo de generosidade e solidariedade de alguns jovens missionários que perderam a vida e outros que sofreram por terem ajudado quem necessitava
a notícia sobre o dia dos missionários mártires fez-me recordar um episódio digno de ser registado pelo bom exemplo de generosidade e solidariedade de alguns jovens missionários que perderam a vida e outros que sofreram por terem ajudado quem necessitava Estávamos no verão de 1960, precisamente no dia dois de julho. Os seminaristas do Seminário Maior do missionário da Consolata de Turim. Itália, encontravam-se a passar um mês de férias numa antiga Cartuxa, situada na encosta dos alpes, à beira do rio Pésio. aqueles jovens, já todos professos no Instituto da Consolata, eram doidos pelas montanhas. Era sempre uma festa quando se subia aos montes. Naquele sábado toda a comunidade foi em passeio todo o dia. Toda a comunidade não completa, pois alguns membros, voluntariamente, ficaram em casa para ceifar, à gadanha, o feno de uma família pobre que vivia junto à nossa Casa. No domingo seguinte havia uma festa no cimo da montanha com a presença do bispo. Nesse sítio havia um nicho dedicado a Nossa Senhora. Durante a guerra um soldado alemão aos tiros com uma metralhadora destruiu a imagem. Tratava-se agora de colocar uma nova imagem e ao mesmo tempo fazer uma romagem de desagravo e reparação por aquele sacrilégio. O grupinho que tinha ficado a ceifar o feno dos vizinhos, quase como prémio por aquela ação generosa, foi representar a nossa comunidade a essa peregrinação. Tudo estava a correr muito bem, mas o tempo, lá no cimo da montanha é imprevisível e de um momento para o outro levantou-se uma tremenda trovoada. as pessoas fugiram e abrigaram-se cada qual onde podia. além do nicho dedicado a Nossa Senhora, havia também uma grande cruz em ferro, apoiada num grande pedestal de cimento à semelhança do Cristo Rei, mas muito menor. ao abrigo desse pedestal recolheram-se vinte e oito pessoas. Foi ali mesmo que caiu uma grande faísca que vitimou quatro pessoas e feriu as restantes, algumas delas com gravidade. Os mortos foram: um homem adulto, civil, uma menina de onze anos e dois dos nossos seminaristas, o Enrico Cana e o Sérgio andreolli. a notícia levou muito tempo a chegar. Era já noite e não sabíamos de nada. Todos nós sentíamos uma certa apreensão. O padre Diretor não podia esconder a sua preocupação e quase não se tirava do portão de entrada à espera de notícias. Já tinha algum pressentimento de que as coisas não tinham corrido bem. Fomos jantar, mas quase não se ouvia urna conversa. Eis que, a certo momento, entra o Diretor com a triste notícia: morreram dois dos nossos clérigos! Ficámos como que fulminados. Num instante todos pousaram os talheres e ninguém mais levou uma colher de comida à boca. Pouco a pouco, todos foram saindo do refeitório em silêncio. Durante todo o tempo de recreio, até à hora de deitar ninguém falou. Ouviam-se soluços e choros em silêncio, muitos recolheram-se na capela a rezar com as lágrimas a correrem pela face, no pátio e nos corredores andavam de um lado para o outro de terço na mão. Tinham morrido dois, mas não sabíamos quem eram. Só no dia seguinte é que soubemos: Henrique Canal e Sérgio andreolli tinham morrido. Pierino Tallone, augusto Tedesco e Mário Solinas estavam no Hospital muito feridos. Não recordo se havia mais alguém. O Sérgio tinha ido para os missionários contrariando a vontade da mãe. Esta, na sua dor inconsolável, chegou a dizer que a morte do filho seria um castigo de Deus pela sua desobediência à vontade da mãe. Nestas circunstâncias, todos os desabafos das mães são compreensivos. Mas, quem sabe se ela não estava já pressentir alguma coisa? Todavia, ela bem depressa mudou de opinião. Nos dois anos seguintes, a senhora quis ir passar férias à Certosa de Pésio com os seminaristas da Consolata. Desejava ir o sítio onde o seu filho tinha perdido a vida. Os seminaristas rodeavam-na de atenções e de carinhos como se ela fosse a mãe de todos. No local do acidente, nada de choros, apenas muitas orações. Depois, era a festa: cantar rir, brincar até mais não. as maravilhosas canções alpinas ecoavam por vales e montanhas até muito longe. a senhora acabou por entrar também na festa. No último ano em que lá esteve, vendo que aquela alegria e aquela boa disposição dos seminaristas era verdadeira e sincera e não alguma coisa só para a consolar, ela disse: agora compreendo porque é que o meu Sérgio tinha tanta vontade em ser missionário da Consolata.