– Sabes, Maria, acho que só me admirei a mim e a Deus. Mas, o mais curioso e triste é que não gosto de mim. Não sou feliz!
– Sabes, Maria, acho que só me admirei a mim e a Deus. Mas, o mais curioso e triste é que não gosto de mim. Não sou feliz!
Mas, o mais curioso e triste é que não gosto de mim. Não sou feliz!
Maria olhava enternecida pa­ra a sua amiga alice, comovida com a sua sinceridade.
– Mas tu és tão amiga, tão disponível, ajudaste tantas pessoas
– Não sei quem sou. Tão depressa estou bem a ajudar, como de repente insulto e sou agressiva para os mais pequenos. O mais caricato é que houve tempos em que até eu pensava que era boa pessoa. Hoje, acho que ser boa pessoa é mais do que isso. Uma boa pessoa não pode andar a magoar os outros, sobretudo quem não é capaz de se defender. Isso é pobreza!
– Como podes dizer isso, se foste a advogada de tantas pessoas sem meios de pagamento, defendeste as suas causas, lutaste ao lado delas!?
– Sim, mas o que eu queria era ganhar. O meu verdadeiro interesse era eu. acredita que ter consciência disto aos 67 anos é frustrante!
Maria sentiu crescer dentro de si a admiração por alice. Sempre a olhara como exemplo de determinação, de liberdade e generosidade. Hoje, admira a sua verdade e coragem de pôr-se em questão.
– Com todas as descobertas de que afinal não és boa pessoa, que pretendes fazer?, desafiou Maria, rindo e tentando reduzir a seriedade daquele encontro de café.
– Não sei! Mas apetece-me conhecer-me! Preciso resolver as minhas contradições. Sempre fui livre, sempre fiz o que quis, disse o que queria dizer e agora vejo-me sozinha, fechada a cuidar da casa e das coisas que fui acumulando. Percebo que fiz tudo errado. até os livros que guardei, estão lá empilhados. Devia ter-lhes dado outra utilidade – sei lá! – partilhado. afinal nunca fui livre.
– Credo, alice! Estás a exagerar. Devias consultar um especialista.
– Vou mesmo. Não é por estar deprimida, mas para me entender a mim mesma. Já te disse que não tenho amigos. Não confio em ninguém. Fecho-me para me proteger. Pus tantas barreiras à minha volta que, quando dei conta, já estava presa. Estou presa, Maria! E o tempo de amar foi passando. Passou!
– Se o teu problema é esse, podes começar já a resolvê-lo. Não atrases mais o tempo. Pessoas para amar não te faltam. até podes começar já por mim!
– Não digas tolices, Maria! Não precisas de mim: tens tanta gente que te rodeia!
– Não me imagino sem ti no meu grupo de amigos. Sabes, alice, o amor é viciante. Quanto mais amor constróis, mais queres construir e mais alargado vai sendo o grupo a que pertences.
– Pergunto-me como só aos 67 anos percebi isso. Mas ainda não o sei viver. Estou muito sozinha, tenho muito para treinar!
– Só podes ter razão, alice: é mesmo uma questão de treino. Quem como tu usa a liberdade para se perguntar e procurar o amor, talvez já o tenha encontrado. Precisa treinar! E é sempre tempo disso! Só então o tempo fica preenchido.