a crise financeira e económica que se alastrou pelo mundo está para ficar por muito tempo. Mais nuns países do que noutros
a crise financeira e económica que se alastrou pelo mundo está para ficar por muito tempo. Mais nuns países do que noutrosO nosso país, de acordo com conceituados economistas, será um daqueles em que ela durará mais. a justificação é a quase estrutural debilidade da economia portuguesa que tem sido incapaz de gerar a riqueza necessária, devido à sua fraca competitividade internacional e incapacidade para refrear um consumismo desregrado.
Uma economia débil condiciona a construção de um desenvolvimento verdadeiramente humano, integral e sustentável, sobretudo quando a sua dramática limitação é a de não conseguir, por influências poderosas que a dominam, distribuir com equidade a riqueza produzida. a prová-lo está o facto de sermos o país da Europa em que são mais acentuadas as desigualdades sociais.
Por isso, quando a crise se instalou entre nós já encontrou um país com, no mínimo, 18 por cento da sua população a viver privada de bens tão essenciais como a alimentação, a saúde, a educação, a habitação Preocupante é o facto de milhares destes portugueses e portuguesas pobres terem nascido nessa condição e, como os seus antepassados, legarem a pobreza, como herança, aos seus descendentes. Permitir que tal aconteça é crime, porque é aniquilar direitos humanos inalienáveis.
a crise global vigente veio agravar mais esta já penosa realidade. Por um lado, está a tornar mais penosa a vida dos cerca de dois milhões de concidadãos nossos que já não conseguiam aceder a condições de subsistência condignas. Por outro, está a contribuir para que, muitos mais, estejam a aumentar o já escandaloso número de pobres. Basta verificar a taxa de desemprego – que não parece ficar por aqui – que atingiu níveis nunca vistos no pós 25 de abril.
Não é necessário elencar as inumeráveis e complexas carências que a crise tem vindo a gerar e as dificuldades para as enfrentar. Tudo isto é já do domínio público. Nem sequer valerá a pena gastar tempo a identificar culpas até porque, estou plenamente convicto, que o maior responsável é o modelo económico em vigor, impulsionador de maneiras de viver que apostam mais na concorrência e competitividade desregrados, para gerar lucros a qualquer preço, mesmo que para isso se tenha que sacrificar o respeito pela dignidade da pessoa humana. E todos temos contribuído, cada um a seu nível, para a sobrevivência deste modelo.
Para superar esta crise e garantir que outras não virão, é imperioso mudar determinados estilos de vida. Identifico alguns: valorizar mais a gratuidade que o utilitarismo; a partilha que o consumismo; a solidariedade que o individualismo; o compromisso que a indiferença; o interesse pelo outro que a despersonalização social; o respeito e a responsabilidade que a ambiguidade nas relações sociais.
Mas como esta solução exige mudanças que não acontecem por decreto, antes, se constrói pela consciencialização para os valores, é urgente assumir medidas imediatas para minorar o sofrimento dos que estão com dificuldades em enfrentar as consequências da crise. Que ninguém se dispense de partilhar os seus bens; de escutar os desesperados e os desiludidos; de incentivar as esperanças e os sonhos; de alertar os poderes públicos e as instituições da sociedade civil para os problemas detectados; de denunciar tudo o que viole direitos humanos.
Participação solidária é a palavra de ordem que convoca todos e todas. É que esta crise – parafraseando o saudoso João Paulo II – poderá ser a madrugada de um mundo novo que está a surgir. Que assim seja, depende de cada um de nós.