O convite era que dançassem a “Polonaise” de Chopin em lá bemol maior, num ritmo africano, antes de qualquer ensaio prévio. a resposta foi: “Não. aqui Chopin, a este andar, certamente adormecia-nos”
O convite era que dançassem a “Polonaise” de Chopin em lá bemol maior, num ritmo africano, antes de qualquer ensaio prévio. a resposta foi: “Não. aqui Chopin, a este andar, certamente adormecia-nos”Dito isto, nunca mais ninguém se lembrou de fazer uma contraproposta. Talvez por isso, o Zimbabué tem vindo a incarnar o rosto do terror democrático em África. O terror democrático expresso nos rostos bifurcados. De um lado, o rosto do velho Mugabe com a pele a despedir-se do ar seco e do ambiente agreste e comprometedor, por aquilo que os seus anos no poder representam politica e socialmente para o país. Do outro, o rosto quase irreconhecível do povo, de tanto sofrer e de tanto esperar numa esperança abundante, mas que afinal não era para eles, como já o dizia Kafka.
Neste encontro dos desencontrados, a comunidade internacional vai gritando e brandindo, orgulhosamente, as proezas das suas sanções. No fundo não são contra Mugabe, mas sim contra o povo que, por sinal, já está suficientemente fustigado por este ódio ofuscante que o anima contra os ocidentais e, em particular, contra os ingleses, ou melhor, contra os sucessivos governos das terras de sua majestade.
É nesta complexa nuvem de um palco mal preparado e de um povo que resiste a dançar a música clássica em tons da democracia envernizada, que o país do octogenário, que outrora foi o símbolo de libertação e hoje um decadente mal humorado, resiste a não ser sepultado na cova da urna.
O terror democrático reside no facto de que Mugabe não pode perder. E reside também no facto de que alguma franja daquele povo sofredor ainda o vê como herói e salvador do país que eles pensam que existe. Mas no fundo não passa de um moderno campo de concentração, onde as pessoas não morrem asfixiadas com gazes, mas morrem com o medo de serem quem são. Razão mais do que suficiente, tendo em conta a vista do panorama africano da democraticidade, para perguntar-se se o princípio da liberdade política é ou não compatível com as tradições africanas. Palonaise ou Batuque?