Naquela sala de aula já vazia, nasceu uma aliança entre ambas que iluminou uma vida inteira. E foi uma aliança abençoada: dois meses depois, Gorete entrava no mundo encantado das letras e das palavras
Naquela sala de aula já vazia, nasceu uma aliança entre ambas que iluminou uma vida inteira. E foi uma aliança abençoada: dois meses depois, Gorete entrava no mundo encantado das letras e das palavrasO rosto de Gorete fala das amarguras de uma vida dura. as suas recordações têm peso de tristeza. Mas sonha, o que lhe dá coragem para não desistir. Um dos sonhos que a fazem sorrir, é imaginar-se a ler. Deseja ler desde que em pequenina entrou na escola, e foi forçada a abandoná-la uma semana depois para ajudar a cuidar dos irmãos.como desejava ter continuado na escola e poder usar lápis, cadernos, livros – mas de certeza que não aprenderia – pensava, por vezes. Sempre lhe disseram: a Gorete não tem cabeça para a escola. Às vezes, às escondidas, entra numa livraria e folheia os livros. Finge que lê, só para sentir um cheiro que não esquece, de há 35 anos, no seu primeiro dia de escola. Um dia Gorete foi à reunião de pais da escola da sua filha. Uma professora foi convidada a falar da importância de ajudar os filhos nos trabalhos escolares. Isso, já Gorete sabia, mas limitava-se a sentir aquela dor por não poder fazê-lo. Se Deus lhe desse uma inteligência maiorParece que Deus estava à escuta da sua prece: é que aquela senhora professora disse que ensinou crianças que até ali não conseguiam aprender a ler. Usando um método que ela desenvolveu e que chamava de ensinar a ler com amor, em um mês as crianças já sabiam ler frases. Esquecida da sua vergonha, levantou-se e perguntou:- Senhora professora, com esse seu método, um adulto sem cabeça para a escola consegue aprender a ler?- a professora percebeu a que adulto Gorete se referia. Por isso, com toda a autoridade de quem sabe o que diz, respondeu:- Se esse adulto quiser muito, e se tiver um professor que saiba ajudá-lo, não tenho dúvidas que consegue!No final da conferência, dirigiu-se à professora Mariana. Ela acolheu-a com um olhar tão terno que Gorete ganhou confiança para fazer um pedido atrevido. – Senhora professora, eu não sei ler. aceita-me como sua aluna?- Porque quer aprender a ler? Quis saber a professora. – Quero ler histórias ao meu filho, quero ler o jornal, o que está à minha volta, quero participar das coisas e tenho vergonha de estar sempre a perguntar. O brilho de esperança misturou-se com o brilho de lágrimas que fugiam ao seu controle. – Pois será para mim um prazer imenso podermos descobrir juntas a sua forma especial de aprender a ler. Naquela sala de aula já vazia, nasceu uma aliança entre ambas que iluminou uma vida inteira. E foi uma aliança abençoada: dois meses depois, Gorete entrava no mundo encantado das letras e das palavras. Era tal a felicidade e a nova atitude de Gorete que a professora Mariana não resistiu: formou uma turma de adultos sem cabeça para a escola e ofereceu-lhes o seu tempo e o seu saber.